Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Arthur Autran Franco de Sá Neto (UFSCar)

Minicurrículo

    Professor da UFSCar desde 2002. Doutorou-se no Instituto de Artes da Unicamp e fez pós-doutorado na Universidade de Buenos Aires. Publicou os livros Alex Viany: crítico e historiador (2003), Imagens do negro na cultura brasileira (2011) e O pensamento industrial cinematográfico brasileiro (2013), bem como colaborou na Enciclopédia do cinema brasileiro (orgs. F. Ramos e L. F. Miranda, 2012). Dirigiu os documentários Minoria absoluta (1995) e A política do cinema (2011)

Ficha do Trabalho

Título

    Dois documentários sob a perspectiva da historiografia audiovisual

Seminário

    Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência

Formato

    Presencial

Resumo

    A comunicação proposta aborda os documentários São Paulo: sinfonia e cacofonia (1994) e Sobre os anos 60 (1999), dirigidos por Jean-Claude Bernardet. O objetivo é analisar estas obras a partir dos discursos historiográficos construídos por elas. A hipótese central de trabalho é que ambas são respostas à crise do discurso sobre o passado do cinema nacional que Bernardet diagnosticou no seu livro Historiografia clássica do cinema brasileiro.

Resumo expandido

    A comunicação abordará os documentários de média-metragem São Paulo: sinfonia e cacofonia (1994) e Sobre os anos 60 (2000), ambos dirigidos por Jean-Claude Bernardet. O primeiro é um filme totalmente constituído por fragmentos de diversas produções cinematográficas brasileiras (de ficção e de não-ficção) realizadas ao longo do século XX e que, de alguma maneira, se relacionam com a cidade de São Paulo. Já o segundo é constituído predominantemente por material proveniente de outras produções audiovisuais, além de obras de artes plásticas, fotografias e material de imprensa, tratando-se de uma reflexão sobre a cultura brasileira, especialmente o cinema, na década de 1960, bem como a respeito dos principais desdobramentos políticos nacionais do período.
    Os documentários de Bernardet, entretanto, não apelam para a cronologia de maneira a costurar estes materiais e nem se escoram predominantemente em aspectos geográficos ou fatos históricos mais conhecidos acerca dos temas tratados.
    No caso de São Paulo: sinfonia e cacofonia, o filme organiza-se por meio de alguns motivos temáticos e/ou visuais que se sucedem ao longo de quase quarenta minutos – por exemplo: o tema da multidão, que surge logo no início documentário, conjuga obras bem diferentes entre si tais como A opção (Ozualdo Candeias, 1981) e fitas de não-ficção realizadas por diretores sem reconhecimento artístico. Já Sobre os anos 60 destaca algumas questões relevantes para a produção artística deste decênio, tais como a representação do povo ou a função do intelectual na sociedade, analisando-as a partir dos materiais elencados acima e com uma diferença importante em relação ao outro documentário: as obras canônicas do cinema brasileiro ganham mais destaque. Assim mesmo, estas últimas não são colocadas em um pedestal, mas retrabalhadas de maneira a possibilitar novas leituras sobre o período abordado. É de se destacar ainda que ambos os documentários possuem trilhas sonoras sofisticadas, seja pela música utilizada, seja ao interpolar o som originalmente utilizado em um determinado filme sobre as imagens de outro.
    A perspectiva proposta para discutir os filmes de Bernardet tem como base a historiografia audiovisual, tal como postulada por Luís Alberto Rocha Melo (2016), para a qual se trata de analisar o discurso sobre a história do cinema construído por documentários ou mesmo filmes de ficção.
    Outrossim, também parto do pressuposto, a ser trabalhado na comunicação, de que São Paulo: sinfonia e cacofonia e Sobre os anos 60 são respostas de Bernardet à crise do discurso historiográfico que ele mesmo diagnosticou no livro fundamental Historiografia clássica do cinema brasileiro (1995). Afigura-se que, para Bernardet, uma das respostas possíveis ao discurso de viés fortemente nacionalista em termos ideológicos, fundamentado em uma narrativa embasada na cronologia e cuja concepção artística pressupunha o longa-metragem de ficção como a culminância da realização cinematográfica, seria justamente a proposta encetada por São Paulo: sinfonia e cacofonia, obra que praticamente escapa do discurso verbal – pois não há locução, sobrando apenas alguns poucos diálogos dos filmes que servem de base ao documentário -, foge da cronologia – por meio da montagem que mistura filmes de diferentes épocas – e nega a hierarquia artística que consagra a ficção – novamente por meio da montagem que mescla obras de canônicas do cinema brasileiro com curtas de diretores pouco conhecidos, documentários do período silencioso, institucionais e outros tipos de produção audiovisual. No que tange a Sobre os anos 60, a obra é uma resposta à crise do discurso historiográfico pela forma como propõe a articulação inovadora para analisar a produção cultural deste decênio, em especial o papel dos artistas e dos intelectuais, pois no livro Historiografia clássica do cinema brasileiro há forte problematização sobre a construção de recortes e contextos.

Bibliografia

    ALLEN, Robert C.; GOMERY, Douglas. Film history: theory and practice. Boston: McGraw Hill, 1985.
    AUTRAN, Arthur. Panorama da historiografia do cinema brasileiro. Alceu, Rio de Janeiro, v. 7, n. 14, jan. jun. 2007. P. 17-30.
    BERNARDET, Jean-Claude. Historiografia clássica do cinema brasileiro: metodologia e pedagogia. São Paulo: Annablume, 1995.
    _____. A migração das imagens. In: TEIXEIRA, Francisco Elinaldo (Org.). Documentário no Brasil: tradição e transformação. São Paulo: Summus, 2004. P. 69-79.
    _____. Cinema brasileiro: propostas para uma história. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
    LAGNY, Michèle. De l’histoire du cinéma – Méthode historique et histoire du cinéma. Paris: Armand Colin, 1992.
    MELO, Luís Rocha. Historiografia audiovisual: a história do cinema escrita pelos filmes. Ars, São Paulo, ano 14, n. 28, 2016. P. 221-245.
    RAMOS, Fernão. Mas afinal … O que é documentário? São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008.