Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Ana Paula Bragaglia (UFF)

Minicurrículo

    Professora Associada. do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (UFF), nos cursos de Graduação em Comunicação Social e Pós-graduação em Mídia e Cotidiano (PPGMC). Pesquisadora com ênfase em Indústria Criativa, Consumo e Ética. Líder do grupo de pesquisa ESC – Ética na Sociedade de Consumo.

Ficha do Trabalho

Título

    Cidade Invisível: novos rumos em busca de representatividade indígena

Resumo

    Em 2021 foi lançada na Netflix, a série brasileira Cidade Invisível, que alcançou amplo sucesso em cerca de 40 países. Personagens como o Homem-Boto; Iara; Curupira; Saci-Pererê; Tutu-Marambá aparecem na trama, sem destaque para a sua origem indígena. Busca-se aqui estudar como se dá o regime de (in)visibilidade de povos originários nesta produção, levantar implicações éticas deste formato e sinalizar novos rumos em busca de uma efetiva representatividade indígena no cinema.

Resumo expandido

    Em fevereiro de 2021 foi lançada na Netflix, a série “Cidade Invisível” (direção de Júlia P. Jordão e Luis Carone; roteiro de Mirna Nogueira, Carolina Munhóz, Carlos Saldanha e Raphael Draccon). A obra brasileira entrou rapidamente para o ranking “Top 10” da Netflix, alcançando sucesso em cerca de 40 países (MINARO, 2021). O enredo destaca elementos do folclore brasileiro, quando um policial, ao tentar desvendar a morte de sua companheira, se depara com diversos personagens, que são crenças de povos indígenas, apesar deste vínculo estar apagado na trama. “Homem-Boto”; “Iara” (“Mãe-D’água”); “Iberê” ou “Curupira”; “Saci-Pererê”; “Tutu-Marambá” (comumente, “Bicho-Papão”, e associado à figura de um porco-do-mato em algumas regiões) são ao menos “cinco entidades pertencentes às espiritualidades indígenas” inseridas no enredo, como destacam Alice Pataxó e Avelin Buniacá. (MORITA, 2021). Este trabalho busca enfatizar, visibilizar e problematizar a seguinte crítica destas ativistas indígenas e pesquisadoras, bem como da socióloga Lai Munihin: por mais que a série tenha obtido sucesso admirável, tal êxito se deve a “investir em uma narrativa sobre a cultura indígena” marcada pela “ausência de atores e profissionais indígenas na produção – além da distorção e folclorização das crenças”. (MORITA, 2021). Mais precisamente, busca-se estudar de que forma se dá a (sub)representação ou o regime de (in)visibilidade de povos originários, especificamente indígenas, nos “regimes de representação” (HALL, 2016) que compõem a produção cinematográfica nacional “Cidade Invisível” (2021), levantar implicações éticas deste formato para os povos indígenas, e sinalizar novos rumos em busca de uma efetiva representatividade indígena. Por “representação”, entende-se, com base em Hall (2016), o “processo pelo qual membros de uma cultura usam a linguagem (amplamente definida como qualquer sistema que emprega signos, qualquer sistema significante) para produzir sentido” (HALL, 2016, p. 108). Ao conjunto de diversas representações em uma determinada época, tem-se o que Hall (2016) denomina de “regime de representação”. Como afirmam Bragaglia, Brochado e Santos (2020, p. 4), “podemos nos arriscar a dizer que Representatividade consiste em ‘regimes de representação’ (HALL, 1996) que geram efetiva adesão/identificação por parte de um dado grupo social, por demonstrarem uma realidade (“espelhamento”) tanto em termos quantitativos, isto é, por meio da presença proporcional de pessoas de um dado grupo nos diversos espaços em relação às populações a eles relacionados, quanto qualitativos, ou seja, em termos de ações e simbologias associadas a ele, as quais, para de fato refleti-lo, devem apresentá-lo com toda a “complexidade de experiências e sentimentos”, e não com reducionismos”. A pesquisa se faz relevante porque, por mais potência estética e de fortalecimento da indústria cinematográfica nacional que Cidade Invisível possua, não há representatividade nem representação (duradoura) na obra. A representatividade é apagada também diante da distorção de narrativas sobre crenças, como afirma Avelin, a exemplo das entidades Curupira e Iara, quando o enredo os associa, respectivamente, a uma criatura hostil que se refugia, na maior parte do tempo, na embriaguez, e a uma sereia de água salgada e não a uma mulher indígena guerreira das águas doces das matas. (MINARO, 2021). Os comentários de internautas publicados em sites de matérias com tais críticas aumentam o interesse em desenvolver o tema: “Contratar índios”? Que besteira é essa, gente?”, é apenas uma das falas ali presentes. (FEFITO, 2021) Como afirma Carneiro (2019), citando Quintão, “‘a exclusão simbólica, a não-representação ou distorções da imagem (…) são formas de violência tão dolorosas, cruéis e prejudiciais que poderiam ser tratadas no âmbito dos direitos humanos’”. É esse tipo de violência que este estudo pretende combater, sem desfavorecer e desmerecer a produção cinematográfica nacional.

Bibliografia

    BRAGAGLIA, Ana Paula; BROCHADO, Samara; SANTOS, Pedro Henrique Conceição dos. A (in)visibilidade de Pessoas Negras na Publicidade: perspectivas interseccionais no regime representacional da campanha “Casa de Férias” da Trivago (2019). Esferas, v.10, p.73 – 86, 2020.
    CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero. In: HOLLANDA, H. (org.). Pensamento Feminista: conceitos fundamentais. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2019.
    KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
    HALL, Stuart. Cultura e representação. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio / Apicuri, 2016.
    hooks, bell. Olhares negros: raça e representação. São Paulo: Elefante, 2019.
    MORITA, Julia Harumi. Cidade Invisível: é possível corrigir falta de representatividade na 2ª temporada? Revista Rolling Stone.
    FEFITO. Cidade Invisível da Netflix é alvo de críticas por ativistas indígenas. Coluna Uol. 18. Fev. 2021.