Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    tatiana a c costa (UNA)

Minicurrículo

    Doutoranda no PPGCom/ UFMG e professora no Centro Universitário UNA, em Belo Horizonte, onde coordena o projeto PRETANÇA. Integrante dos grupos de estudos/pesquisa CORAGEM – Comunicação, Raça e Gênero – e Poéticas da Experiência, ambos na UFMG. Integrande do FICINE, APAN e segundaPRETA, colabora em festivais de cinema e cineclubes como curadora, programadora e júri. Co-autora dos livros “Olhares Contemporâneos” (2011), “Mulheres Comunicam: Mediações, Sociedade e Feminismos” (2016), entre outros

Ficha do Trabalho

Título

    QuilomboCinema : Ficções e encruzilhadas no Cinema Negro Brasileiro C

Seminário

    Cinemas negros: estéticas, narrativas e políticas audiovisuais na África e nas afrodiásporas.

Resumo

    Este trabalho apresenta parte de pesquisa em andamento que busca compreender o Cinema Negro Brasileiro no que ele agencia de possibilidades de testemunho e elaboração fabulatória das negruras. A compreensão dessa a existência das negruras com e nas imagens e sons na contemporaneidade se dá a partir de uma multiplicidade de sujeitos em interação em campos para além da realização dos filmes, um fenômeno que chamo aqui de QuilomboCinema.

Resumo expandido

    Este trabalho apresenta parte de uma pesquisa em andamento que busca compreender o Cinema Negro Brasileiro no que ele agencia de possibilidades de testemunho e elaboração fabulatória das negruras, suas memórias e pertencimentos. A compreensão dessa a existência com e nas imagens e sons não se dá a partir de um indivíduo ou filme isolado: considero a multiplicidade de sujeitos em interação em campos para além da realização dos filmes, incluindo a pesquisa, a crítica e a curadoria e constituindo um campo/fenômeno que chamo aqui de QuilomboCinema. O conjunto de filmes adotados nesta proposta de investigação vem desse contexto compreendido aqui, também, como um “lugar disruptivo” anunciado por bell hooks (2018) em sua discussão sobre o “olhar opositor”. Para compreender este fenômeno e analisar os filmes gerados neste contexto, tomo para este estudo parâmetros epistemológicos afro-brasileiros, predominantemente Bantu e com algumas aproximações/interseções Nagô. Empreendo uma experimentação com uma metodologia da encruzilhada e trazendo os conceitos de “afrografia” e “tempo espiralar” trabalhadas por Leda Maria Martins (1997 e 2002) em ginga com outras perspectivas decoloniais/contra-coloniais e com aportes teórico-conceituais mais específicos no campo de estudos de Cinema, numa tentativa de dar conta das particularidades raciais – as negruras – das construções simbólicas presentes nas obras. Parto da hipótese de que o Cinema Negro Brasileiro, na contemporaneidade é realizado por e com corpos-ficção num contexto de aquilombamento e numa elaboração de uma experiência negra em sua multiplicidade. A ideia de aquilombamento é articulada com os apontamentos sobre a genealogia do termo Quilombo elaborada por Maria Beatriz Nascimento (2018). Nascimento descreve a trajetória que possibilita a transição do termo Kilombo desde África até seu uso como “instrumento ideológico” e “ficção participativa” no século XX. Essa discussão também aproxima-se do Quilombismo de Abdias do Nascimento (2019). A ideia de corpo-ficção é importante para compreender a dimensão inventada do que nos nomeia como uma outridade e, junto disso, a potência de invenção de si que constitui os sujeitos não-hegemônicos – especificamente, aqui, pessoas negras num país que ainda não se conciliou com seu passado colonial e escravagista. Para compreender a problematização e elaboração da identidade negra com e no Cinema, aproximo Jacques Ranciere (2013) e Achille Mbembe (2018) no que cada um deles articula da ideia de ficção. A noção de encruzilhada é tomada aqui, a partir de Leda Maria Martins (1997) como um “lugar radial”, “operadora de linguagens e discursos”. O movimento da/na encruzilhada nos possibilita compreender os filmes no que eles concentram e dispersam desse pensamento aquilombado. Os filmes, que chamo aqui de radiais, condensam, cada um a sua maneira, questões que me parecem centrais para esta pesquisa, sobretudo no que apresentam de possibilidades de articulações de uma epistemologia preta que podem colaborar para a observação de outros filmes no contexto do fenômeno CinemaQuilombo. Entre as questões estão: a temporalidade espiralar (MARTINS, 1997) articulada em Travessia (Safira Moreira, 2017); a espacialidade negra nas discussões sobre encruzilhada (MARTINS, 1997) e geografias negras / black geographies (MCKITTRICK, 2010) presentes na topografia constitutiva da estrutura de noireBLUE (Ana Pi, 2018); a figuração da “dupla consciência” dos sujeitos negros diaspóricos (W. E.B. Dubois apud GILROY, 2012) realizada em República (Grace Passô, 2020); e articulações mais diretamente relacionadas às cosmogonias africanas e afrodiaspóricas aplicadas às formas fílmicas, como a estrutura-oriqui de Pattaki (Everlane Moraes, 2019). No movimento próprio da encruzilhada, as questões se fazem presentes em atravessamentos e sobreposições, se espraiando nos curtas deste pequeno conjunto.

Bibliografia

    GILROY, P.. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2012.
    hooks, bell. Olhares negros: raça e representação. São Paulo: Elefante, 2019.
    MARTINS, L. M. Afrografias da Memória: o Reinado do Rosário no Jatobá. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Mazza Edições, 1997.
    MBEMBE, A.. Crítica da Razão Negra. São Paulo: N -1 edições, 2018.
    MCKITTRICK, K.; WOODS, C. Black Geographies and the Politics of Place. Toronto: Between the Lines, 2007.
    NASCIMENTO, A.. O Quilombismo: documentos de uma militância Pan-Africanista. São Paulo: Perspectiva, 2019.
    NASCIMENTO, M. B.. Beatriz Nascimento quilombola e intelectual: possibilidades nos dias da destruição. Diáspora Africana: Editora Filhos da África, 2018.
    RANCIERE, J.. A fábula cinematográfica. Campinas: Papirus, 2013.