Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Reinaldo Cardenuto Filho (UFF)

Minicurrículo

    Reinaldo Cardenuto é Professor Adjunto do Departamento de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense e possui doutorado em Meios e Processos Audiovisuais (ECA-USP). Dentre suas publicações, encontra-se o livro “Por um cinema popular: Leon Hirszman, política e resistência” (Ateliê Editorial, 2020). Em 2016, dirigiu o documentário “Entre imagens (intervalos)” e organizou o livro “Antonio Benetazzo, permanências do sensível”. É coordenador editorial da revista C-Legenda.

Ficha do Trabalho

Título

    A disputa pelo Cinema Novo nas páginas da imprensa carioca

Seminário

    Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência

Resumo

    Em 1962, a euforia tomou a imprensa carioca. Diante de novos filmes brasileiros com temas sociais, a crítica nomeou o processo de renovação como Cinema novo, difundindo um viés elástico a incluir vasto espectro de formas estéticas. Porém, para uma jovem geração de autores, a noção genérica constituía perda de substância. Em sua opinião, Cinema novo era exclusivamente um movimento político e formal revolucionário. Atuando na imprensa, eles disputariam um conceito central na história da cultura.

Resumo expandido

    No primeiro semestre de 1962, na imprensa sediada no Rio de Janeiro, os críticos de cinema experimentaram uma euforia coletiva. Renegando uma produção cinematográfica nacional que consideravam precária, sobretudo devido ao domínio das chanchadas, a crítica jornalística divulgava, com grande empolgação, inúmeras notícias sobre novos filmes que prometiam superar a condição subdesenvolvida do cinema brasileiro. Anunciadas em jornais ideologicamente diversos como Correio da manhã, Diário Carioca, O metropolitano, Tribuna da imprensa ou Última hora, as expectativas de futuro, não tão distantes, pareciam concretizar-se diante da qualidade técnica e da boa acolhida nacional e internacional de um conjunto de filmes formado por “Couro de gato”, “Os cafajestes”, “O pagador de promessas” e “Barravento”.

    Ainda que fossem obras esteticamente plurais, entre refutações e adesões às exigências do mercado, a crítica celebrava o conjunto de filmes como potência nascente, elogiando a diversidade das produções “sérias” na luta pela afirmação de uma indústria nacional de cinema. Tomados pelo entusiasmo, pela crença em mudanças, os críticos passariam a identificar o movimento de renovação fílmica a partir de um termo recentemente criado: Cinema novo. Ely Azeredo, Alex Viany, Luiz Alipio de Barros, Octavio de Faria e outros, incluindo os irmãos Geraldo e Renato Santos Pereira, adotariam e difundiriam naquele momento um conceito generalista de Cinema novo, no qual agrupavam-se indistintamente todos os filmes tidos como renovadores do cenário cultural, obras esteticamente diversas em que notavam avanços de qualidade, além da presença difusa de temáticas sociais brasileiras. A ordem do dia era comemorar quaisquer obras avessas ao gênero da chanchada. Tal conjunção eufórica, a aproximar nomes tão díspares, tinha, no entanto, data para acabar.

    Cada vez mais incomodados com a perspectiva generalista que vinha dominando os periódicos, e que celebrava as formas convencionais de “O pagador de promessas”, de Anselmo Duarte, e “Assalto ao trem pagador”, de Roberto Farias, como marcos de renovação, os jovens realizadores de filmes políticos, também críticos de cinema, passariam a demarcar publicamente suas contrariedades. Sobretudo a partir de setembro de 1962, nas edições do jornal estudantil O metropolitano, Carlos Diegues, Miguel Borges e Glauber Rocha, redefinindo posições e operando rachas, se voltariam para a defesa de outro conceito de Cinema novo, até então posto à margem na imprensa carioca, no qual propunha-se um cinema moderno e autoral independente aos ditames industriais, em busca de experimentação estética e comprometido com um engajamento político mais radical. Graças a esse desvio, momento em que o termo Cinema novo passou a ganhar maior força como vanguarda artística e ideológica, o frentismo eufórico da imprensa carioca se dissolveria no ar. O combate entre os dois conceitos de Cinema novo, um elástico e outro mais específico, terá como vencedor aquele encabeçado pela jovem geração de realizadores. Ponto de culminância da batalha, o livro “Revisão crítica do cinema brasileiro”, lançado por Glauber Rocha em 1963, resulta de disputas que atravessaram, de modo caloroso, os principais periódicos do Rio de Janeiro.

Bibliografia

    ARAÚJO, Mateus (org.). Glauber Rocha: crítica esparsa (1957-1965). Belo Horizonte: Fundação Clóvis Salgado, 2019.

    AUTRAN, Arthur. Alex Viany: crítico e historiador. São Paulo: Perspectiva, 2003.

    BOURDIEU, Pierre. As regras da arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

    BRUM, Alessandra Souza Malett. “A Nouvelle Vague sob o ponto de vista do jornal O metropolitano”. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 26, n. 51, jan.-jun. 2013, p. 193-212.

    CARVALHO, Maria do Socorro Silva. A nova onda baiana: cinema na Bahia 1958/1962. Salvador: Edufba, 2003.

    DIEGUES, Carlos. Vida de cinema: antes, durante e depois do Cinema Novo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014.

    MARIE, Michel. A Nouvelle Vague e Godard. Campinas: Papirus, 2011.

    ROCHA, Glauber. Revisão crítica do cinema brasileiro. São Paulo: Cosac & Naify,
    2003.

    __________. Revolução do cinema novo. São Paulo: Cosac & Naify, 2004.

    VIANY, Alex. O processo do Cinema Novo. Rio de Janeiro: Aeroplano, 1999.