Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Mannuela Ramos da Costa (UFPE)

Minicurrículo

    Professora no curso de Cinema e Audiovisual da UFPE. Doutora pelo PPGCOM/UFRJ, com estágio Sanduíche na Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3. Mestre em Comunicação/UFPE e especialista em Gestão Cultural pelo Itaú Cultural/Úniversitat Girona. Produtora, produtora executiva e diretora em curtas e longas-metragens, vídeos institucionais, curtas e séries para TV. Sua pesquisa se concentra na área de produção, mercado e políticas públicas para o audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    O cineasta e sua gestalt. Contribuições metodológicas para a teoria.

Seminário

    Teoria de Cineastas

Resumo

    O filme sofre diversas metamorfoses no processo de realização, além de ser mediado pelas diversas instâncias externas à ele. A proposta metodológica da Teoria de Cineastas sugere tanto a análise do filme, quanto dos textos produzidos pelos cineastas, incluídos no contexto em que se produzem. Como reflexão, busco compreender essas subjetividades dentro das coletividades em que se forjam e incluir os aspectos institucionais (econômicos e políticos), por influenciarem diretamente a realização.

Resumo expandido

    No mundo da arte, por mais solitária que seja a execução de uma tarefa, muitos outros indivíduos colaboram para que ela ocorra, nos levando à ideia de cadeia produtiva (da produção à circulação), cena e circuito (HERSCHMANN, 2013, p.45), a depender do grau de formalização e rigidez de suas estruturas e relações. Em atividades essencialmente coletivas, como no cinema, essas colaborações tornam-se ainda mais evidentes, das quais derivam igualmente convenções e discordâncias. Para Becker (1999, p.101), é o aprofundamento das relações de colaboração e trabalho conjunto que definem as convenções: formas de fazer, preconcepções e decisões, até arbitrárias, mas que respondem a motivações, afecções e interesses subjetivos, possibilidades e limitações técnicas ou financeiras. O autor (id.) defende que esse mundo da arte é composto por todos cujas atividades são necessárias à realização da obra (incluindo o espectador), e estes atores partilham de valores comuns, manifestados em práticas (rotinas e modos de fazer) e artefatos utilizados regularmente: “as obras artísticas não são produto de indivíduos geniais, muito mais o resultado de um trabalho coletivo de todos aqueles que cooperam através das convenções características de um mundo da arte que permite a existência dessas obras” (BECKER, 1999, p.102). Essencialmente, as metodologias da Teoria de Cineastas sugerem tanto a análise da obra como materialidade de um pensamento, quanto os textos (aqui entendidos em sua variedade de expressões e formas) produzidos por estes cineastas, ambos incluídos no contexto em que se produzem. Como forma de reflexão, sugiro aqui o tratamento dessas instâncias não apenas pelo viés individual, mas de compreender as subjetividades dos cineastas dentro das coletividades em que se forjam e nas quais atuam. Assume-se que o filme é, por natureza, obra coletiva e que entre o argumento e a montagem, diversas metamorfoses acontecem, assim como mediações com as diversas instâncias externas à obra: aspectos econômicos, legislativos e políticos, lidos como instituições que agem diretamente sobre as condições de criação e realização, por meio de suas regras, agentes e fluxo de informações próprios. Coletivos artísticos, selos e produtoras formadas por mais de um cineasta, podem ser entendidos como um grupo mais ou menos estável de cooperação, em que há uma partilha de saberes e crenças, bem como uma colaboração mútua nos trabalhos, intercambiando funções e posições a cada filme. Esse estilo de colaboração já é conhecido e foi intensivamente explorado por diversos estudos (a exemplo do Alumbramento, CE-RJ-MG; Casa de Cinema, RS; Teia, MG; Duas Mariola, RJ; Símio Filmes, RJ; Trincheira Filmes, PE; Filmes a Granel, PB) e conta com depoimentos, cartas, manifestos e filmes, que expressam desejos, motivações e perspectivas artísticas que denotam as convenções adotadas pelos cineastas como um posicionamento coletivo, que congrega uma diversidade de atores, territórios e obras. Acrescente-se que Costa (2017) alertou para o peso da institucionalidade, isto é, instituições, físicas ou abstratas, que tem regras e processos próprios e que condicionam a agência humana, estruturando ou mediando as relações e os objetos que delas resultam. Na realização audiovisual, o sistema de leis, políticas e condições econômicas contingenciam e condicionam as produções (o tamanho das equipes, as escolhas de elenco, de locações e até as narrativas) tão fortemente quanto o ethos estético (MAFFESOLI, 2010) que delas se depreende (observe-se o conjunto de obras de um determinado grupo de cineastas), de uma geração ou movimento político-estético. Pretendo demonstrar, a partir de um conjunto de filmes e entrevistas concedidas a mim por diversos profissionais, como essas instâncias (a coletividade e a institucionalidade) estruturam o pensamento e a obra de cineastas, sugerindo ainda a inclusão de produtores como colaboradores criativos nos filmes independentes em que atuam no contexto contemporâneo.

Bibliografia

    BECKER, Howard S. Les Mondes de l’art. Trad.: Jeanne Bouniort. Flammarion: Paris, 2010. 380p.
    ___. Propos sur l’art. Trad.: Jean Kempf. Paris: Harmmatan: 1999.
    Costa, Mannuela. CINEMA BRASILEIRO INDEPENDENTE NO CONTEXTO CONTEMPORÂNEO: ENTRE A FICÇÃO E A REALIDADE. Rio de Janeiro, 2017. 257p.
    HERSCHMANN, Michael. Cenas, Circuitos e Territorialidades Sônico-Musicais. In: JANOTTI JÚNIOR, Jeder (org.). Guararema, SP : Anadarco, 2013. pp. 41-56.
    GRAÇA, André Rui. BAGGIO, Eduardo. T. PENAFRIA, Manuela. Teoria dos cineastas: uma abordagem para a teoria do cinema. Revista Científica/FAP, Curitiba, v.12, p. 19-32, jan./jun. 2015
    MAFFESOLI, Michel. Les temps des tribus. Le déclin de l’individualisme dans les sociétés postmodernes. Paris: La table ronde, 2000. pp. 09-60;130-183.
    ___. O tempo das tribos. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1987.
    RANCIÈRE, Jaques. A Partilha do Sensível. Estética e Política. Trad.: Mônica Costa Netto.
    São Paulo: Exo Experimental org.; Editora 34, 2009. 72