Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Angelita Maria Bogado (UFRB)

Minicurrículo

    Bacharel em Com. Social e Letras. Mestre em Estudos Literários (UNESP). Doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA). Profa. do Curso de Cinema e Audiovisual da UFRB. Atualmente se dedica ao estudo das relações entre história e estética: ausências, percepção e sentido no cinema brasileiro contemporâneo produzido em territórios periféricos. Coordena o Grupo de Estudos em Experiência Estética: Comunicação e Artes (GEEECA-CNPq) com a pesquisa Cinema do entrelugar: experiência e estética.

Ficha do Trabalho

Título

    Dez anos da Rosza Filmes no Recôncavo da Bahia, cinema e território

Seminário

    Cinemas pós-coloniais e periféricos

Resumo

    A URFB tem gestado empreendedores culturais que conseguiram romper a barragem do discurso hegemônico e estão dando vazante a imagens silenciadas pela história. Foi nesse espaço potente que Rosa e Nicácio, através de uma gramática própria e uma prosódia local, encontraram uma forma de ocupar esse espaço e levar as imagens do Recôncavo para outras margens. O estudo pretende apontar como essa escolha política de ocupar o território promove desdobramentos estéticos na cena fílmica.

Resumo expandido

    A formação humanística da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (URFB), tem gestado empreendedores culturais que conseguiram romper a barragem do discurso hegemônico e estão dando vazante a imagens silenciadas e apagadas pela história. Foi nesse espaço potente que os realizadores Ary Rosa e Glenda Nicácio, através de uma gramática própria e uma prosódia local, encontraram uma forma de ocupar esse espaço e levar as imagens do Recôncavo para outras margens.
    A dupla de cineastas tem produzido filmes que colocam o Estado da Bahia na dimensão real da sua importância para a história do cinema brasileiro contemporâneo, projetaram, até o momento, quatro longas metragens, Café com canela (2017), Ilha (2018), Até o fim (2020), Voltei! (2021) e uma web série, Mugunzá (2021). Uma produção premiada mundialmente, acolhida por festivais nacionais e internacionais e aclamada pela crítica. Felippo Pitanga (2021) considera que a estreia de Café com canela, no 50° Festival de Brasília, abalou o cenário cinematográfico contemporâneo brasileiro por tornar visível inúmeras demandas reprimidas.
    Esse projeto de investigação se impõe como tarefa a proposição de uma abordagem histórico-estética do cinema produzido pela produtora coletivo Rosza Filmes que comemora, neste ano, dez anos de existência. A história da Rosza e sua produção são atravessadas pelas políticas públicas educacionais entre os anos de 2003 e 2010. Nesse período, implantou-se no Brasil um processo de ampliação e interiorização das Universidades Federais. Rosa e Nicácio compreenderam muito cedo a cena política de um governo que ao implantar um curso de graduação em Cinema, no interior da Bahia, buscava fomentar imagens de um país esquecido/apagado pelo próprio estado.
    A criação da UFRB, em 2005, inaugura uma página importante dessa história. Com a sua chegada, no Recôncavo baiano, pessoas historicamente excluídas e invisibilizadas no âmbito do ensino superior são acolhidas. Trata-se de um território marcado por um passado colonial. A cidade de Cachoeira, sede do campus do curso de Cinema e Audiovisual, é banhada pelo Rio Paraguaçu, muitos navios negreiros aportaram aqui, instalando um quadro de desigualdades que reverbera até os dias de hoje.
    Seguindo os rastros de três personagens encarnadas pela atriz Arlete Dias, Fátima (Voltei!), Brasil (Ilha) e Rose (Até o fim), vamos trazer para o primeiro plano um território ancestral, negro e de tradição oral, mas que teve suas imagens e narrativas represadas por um país excludente. Não se trata apenas de uma aproximação pautada na atuação de Arlete Dias, a performance em cena e das cenas se auto referenciam, articulando uma possibilidade interessante de cruzamento entre obras. Desta forma, recolhendo os cacos da história, de um mundo ficcional, vamos aproximar os filmes com o objetivo de produzir chaves de leitura e fomentar imagens que ainda estão porvir no mundo vivido.
    O modo de aparição das imagens se dá, muitas vezes, por meio da insuficiência e precariedade do saber e do ver, ou seja, o cinema se apropria e ressignifica os mecanismos de apagamentos e silenciamentos empregados pelo opressor. A imagem, nos filmes aqui estudados, se forma em espaços intermediários, na articulação entre passado e presente, entre o silêncio e a fala, entre o primeiro e segundo plano, entre o dentro e fora do quadro, entre o mundo vivido e o mundo imaginado (BRASIL, 2014).
    O estudo pretende apontar como essa escolha política de ocupar o território promove desdobramentos estéticos na cena fílmica que por sua vez volta para tencionar o território e o seu ordenamento. O corpo da cena roszeana dialoga diretamente com a experiência das ruas. Os personagens ao partilharem seus traumas e conflitos do passado, decorrentes de uma truculenta relação com os fantasmas do colonialismo, do racismo e do patriarcado, reconhecem esse passado doloroso nos seus presentes, e por meio do afeto e da partilha, (re)constroem suas histórias.

Bibliografia

    BARBOSA, H. Filhas da diáspora: uma revisão teórica sobre experiência estética numa perspectiva feminista e antiracista. In: ALMEIDA, A & CARDOSO FILHO, J. (org.). Comunicação, estética e política: epistemologias, problemas e pesquisas. Curitiba: Appris, 2020.
    BHABHA, H. O local da cultura. BH: UFMG, 2007.
    BRASIL, A. A performance: entre o vivido e o imaginado. In: Experiência estética e performance. PICADO, B; et al. (Orgs.). SSA: EDUFBA, 2014, p. 131-145.
    DEWEY, J. Arte como experiência. SP: Martins Fontes, 2010.
    FREITAS, K.; MESSIAS, J. O futuro será negro ou não será , Das Questões: v. 6 n. 1 (2018): Extremophilia.
    GINZBURG, J. A interpretação do rastro em Walter Benjamin. In: SEDLMAYER; GINZBURG, (Orgs). Walter Benjamin: rastro, aura e história. BH: Ed. UFMG, 2012. p. 107-132
    LÖWY, M. Walter Benjamin: aviso de incêndio. SP: Boitempo, 2005.
    PITANGA, F. Revista Fórum, 2021. https://revistaforum.com.br/cultura/novo-filme-da-dupla-mais-quente-do-reconcavo-baiano-