Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Mario Caillaux Oliveira (UnB)

Minicurrículo

    Mario Caillaux é doutorando em Teoria e História da Arte pelo Programa de Pós Graduação em Artes Visuais da Universidade de Brasília (PPGAV UnB), onde pesquisa a relação das imagens em movimento com as artes plásticas no Brasil. Mestre em Artes Visuais pelo PPGAV da UFRJ com a dissertação Raymundo Colares: além da ultrapassagem. Produtor, montador e finalizador de filmes, onde se destacam: Desarquivando Alice Gonzaga (2017), Dissecando Antonieta (2015) e a série Luz & Sombra

Ficha do Trabalho

Título

    Experimentalismo: diálogo entre o cinema marginal e as artes visuais

Seminário

    Cinema experimental: histórias, teorias e poéticas

Resumo

    O experimentalismo esteve bastante presente na cultura brasileira entre os anos de 1960 e início da década de 1970. Investigaremos como o cinema e as artes visuais, neste período, compreenderam e trabalharam esta questão, e de que forma estas estratégias se assemelham ou se distanciam. Para isso iremos analisar e confrontar duas imagens: uma cena do filme Família do Barulho (1970), de Júlio Bressane, onde a atriz Helena Ignez vomita sangue, e a obra Língua Apunhalada (1968), de Lygia Pape.

Resumo expandido

    […] o experimental não é ‘arte experimental’ / os fios soltos do experimental são energias q brotam para um número aberto de possibilidades / no Brasil há fios soltos num campo de possibilidades: por que não explorá-los? (Oiticica, 2011, p158)

    “O experimental em nosso cinema é a música da mente livre, A iluminação de um novo continente. A música de um novo ser da experimental cinematografia terrestre ou não. Estética visionária. / Cinema: poema. Autor de cinema: poeta. Experimental: profeta. / Experimental: antena. Cinema: a estética da luz.”(Ferreira, 1986 p.16)

    A defesa do experimentalismo como alternativa ao desenvolvimento da cultura brasileira foi uma característica bastante marcante do período do final dos anos de 1960 e início da década de 1970. Desde o movimento do cinema novo, a ideia de liberdade, tanto na forma quanto na temática, vinha sendo explorada e ganha novos contornos com o aparecimento do chamado cinema marginal. Já no universo das artes plásticas, o próprio desdobramento das vertentes construtivas – concretismo e neoconcretismo – levou à exploração de outros sentidos, que não mais apenas o visual. Paralelamente, a conturbada situação política que o Brasil vivia, e que se intensifica com o golpe militar de 1964, também acaba influenciando a atuação dos cineastas e artistas visuais e consequentemente o próprio desenvolvimento de suas obras.
    Em 1968, Lygia Pape desenvolve um poema visual chamado de Língua Apunhalada. Está obra é um autorretrato fotográfico, em preto e branco, com um close do rosto da artista com a língua para fora, onde vemos um líquido preto escorrendo, no sentido horizontal. Através do título, sugere-se um ato de violência neste músculo. Dois anos depois, em 1970, em uma das cenas finais do filme “Família do Barulho” de Júlio Bressane, a atriz Helena Ignez aparece em um close frontal com um líquido escuro, escorrendo pelas extremidades dos seus lábios. Um vômito contido de sangue. Porém, a forma que essa mancha adquire no rosto da atriz, um borrão escuro do lábio inferior até o queixo, nos remete a uma língua ensanguentada. Como se a atriz estivesse com ela para fora da boca, como no caso da imagem de Pape.
    A questão temática se sobressai, principalmente, se levarmos em conta o momento político que o Brasil vivia. Análises e estudos de ambos os trabalhos percorreram este caminho, apontando como uma estratégia de resposta conturbada situação política. Ou ainda, uma introdução de novos temas – questões sociais e de gênero – que, até então, de uma certa maneira, eram ignoradas por nossa cultura. Mas para além destes aspectos, as semelhanças estratégicas destas imagens são bastante fortes.
    O que mostraremos é que, apesar de partirem de pesquisas estéticas em meios diferentes, existem pontos em comuns na base da construção destas imagens e, consequentemente, nos trabalhos destes artistas e dos grupos que eles participavam. Uma transformação da obra de arte, um alargamento de seus limites, tanto no cinema quanto das artes plástica. Uma mudança da própria linguagem e do objeto artístico, sejam eles fotografia, pintura, filme ou objeto. Ou seja, o próprio conceito de intermidialidade, que “implica todos os tipos de inter relação e interação entre mídias; uma metáfora frequentemente aplicada a esses processos fala de ‘cruzar fronteiras’ que separam as mídias.” (Cluver, 2011, p 9)
    Porém, nestes casos, toda esta reformulação aconteceu seguindo preceitos bem próximos, uma incorporação de um tipo de experimentalismo. Mas será que este conceito de experimental é o mesmo? Mário Pedrosa nesta época, utilizou a expressão “exercício experimental de liberdade” como uma alternativa à perda de autonomia que o objeto artístico vinha sofrendo no advento da arte pós moderna. Será que no caso do cinema marginal podemos pensar por esta via?

Bibliografia

    ARANTES, Otília.Política das artes / Mário Pedrosa São Paulo: EdUSP,1995
    BRITO, Ronaldo. Neoconcretismo: vértice e ruptura. Rio de Janeiro: Funarte,1985
    CLUVER, Claus. Intermidialidade in:Pós Belo Horizonte: v.1,n.2, 2011
    COCCHIARALE, Fernando. Filmes de artistas: Brasil 1965-80. Rio de Janeiro:Contra Capa Livraria / Metropolis Produções Culturais,2007
    FEREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Embrafilme e Editora Max Limonand, 1986
    NETO,Torquato & SAILORMOON, Waly(org.). Navilouca Rio de Janeiro,1972
    OITICICA, Hélio. experimentar o experimental. IN: OITICICA FILHO, César (Org.) Hélio Oiticica: museu é o mundo. Rio de Janeiro: Beco do Azougue,2011
    PAPE, Lygia. Lygia Pape / entrevista a Lúcia Carneiro e Ileana Pradilla. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,1998
    PARENTE, André Passagens Entre Fotografia e Cinema na Arte Brasileira. Rio de Janeiro:+2 Editora, 2015
    XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal São Paulo: Cosac Naify, 2012.