Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Rodrigo Hubert Leme (UFMG)

Minicurrículo

    Atualmente cursando mestrado em artes na UFMG, sua pesquisa foca nas representações de imagens coletivas no cinema brasileiro contemporâneo. Escreveu e dirigiu alguns curtas, dentre eles Eu sou o ditador e Ferida, todos exibidos em festivais ao redor do Brasil. Foi montador dos curtas Broto e Um Estranho no Escuro e trabalhou na equipe de coordenação de pós-produção na O2 Filmes.

Ficha do Trabalho

Título

    Comunidades em negativo: caminhos da coralidade no cinema

Resumo

    A partir do entendimento do termo “coralidade” tal como empregado em diversos estudos nos campos das artes, esse trabalho evidencia a existência de instâncias corais no cinema observando suas presenças na crítica sobre o neorrealismo italiano e em cena no atual cinema documentário-ficcional brasileiro. Através dessas relações, busca-se entender as possibilidades da coralidade em tela e como suas questões se revelam pertinentes para o compreendimento de imagens coletivas no cinema nacional.

Resumo expandido

    Uma tensão entre indivíduo e coletivo que atua através do abismo entre um e outro; a impossibilidade de se representar a comunidade em cena no contemporâneo; um princípio de criação coletivo, sem hierarquias, que dissolve a autoria e a agência da composição do que está em cena; uma amplificadora de aflições individuais através da multiplicidade de vozes: a coralidade, sem dúvidas, possui diversas formas de compreensão que derivam das suas diversas maneiras de ser. Enquanto termo, surge em trabalhos, relatos e críticas nas mais diversas formas de arte, mas de formas pontuais ao longo da história. Teóricos do teatro francês vão compreender sua presença na cena contemporânea: Jean-Pierre Sarrazac e Megevánd vão explorar o termo em seus estudos sobre a cena teatral moderna e contemporânea; a revista francesa Alternatives Theatráles dedicará uma de suas edições inteiramente ao tema, com a tradução do artigo de Christophe Triau sendo particular fonte de contato para a pesquisa contemporânea da coralidade no Brasil. Autores nacionais, como Fábio Cordeiro, também vão se debruçar sobre o assunto na cena teatral brasileira.

    O cinema não é estranho ao termo. A crítica italiana irá utilizar com frequência a palavra coralitá em seus textos a respeito do neorrealismo italiano. Pode-se observar as mesmas características que compõem a coralidade conforme descrita pelos autores acima no cinema de Peter Brook – não à toa também diretor de teatro – em obras como Marat/Sade, onde o próprio ato de atuar torna-se força de um processo coral quando, na narrativa, os pacientes de um hospício são colocados para encenar o assassinato de Jean-Paul Marat e, dessa forma, tornam-se aos olhos do público indivíduos unidos pela sua condição de pacientes. No Brasil, encenações que flertam com a coralidade revelam-se cada vez mais frequentes na tela grande: ficções vão se preocupar menos com protagonistas individuais e mais com a relação entre indivíduos e o grupo que compõem, como pode-se observar em Bacurau, de Juliano Dornelles e Kleber Mendonça Filho, No Coração do Mundo, de Maurílio Martins e Gabriel Martins e Corpo Elétrico, de Marcelo Caetano. Muito antes: há grande potência coral em filmes como Terra em Transe, de Glauber Rocha ou Orfeu Negro, de Marcel Camus.

    A capacidade de uma imagem coral em friccionar individualidades através de um processo de tensionamento entre indivíduo e coletivo não encontra paralelos exatos no estudo do cinema nacional. Dessa forma, o trabalho tenta compreender algumas das formas em que a coralidade aparece na teoria de diferentes suportes artísticos e de meios de comunicação, do teatro à etnografia das vozes, da literatura ao cinema, para tentar evidenciar algumas de suas características em comum e apresentar algumas de suas possíveis interpretações, levantando aspectos que podem ser úteis como ferramentas para se explorar a coralidade no cinema. Tomando essa discussão como base, analisa-se a presença de imagens corais no cinema, a partir do uso do termo em italiano coralitá como presença frequente na discussão e na crítica a respeito do neorrealismo italiano, entendendo suas qualidades “fantasmagóricas” e suas particularidades no cinema. Em seguida, utilizo o termo para iniciar uma análise do cinema documental, não-ficcional e híbrido brasileiro a partir da coralidade que ele apresenta. Através dessa análise, serão evidenciadas algumas características específicas que o processo coral produz quando se encontra dentro dessa cinematografia, que dão abertura a reflexões e análises que podem por muitas vezes fugir de uma teoria tradicional do cinema.

Bibliografia

    ALSOP, Elizabeth. “The Imaginary Crowd: Neorealism and the Uses of Coralità. The Velvet Light Trap”. n. 74, p. 27–41, 2014.

    CONNOR, Steven. Choralities. In: Twentieth-Century Music. Vol 13. Cambridge University Press, Londres, 2016.

    LAMPERT, Cristian. “A coralidade como princípio de criação cênica: notas para uma discussão”. Santa Catarina, UDESC, 2021.

    PIRRO, Robert. “Cinematic Traces of Participatory Democracy in Early Postwar Italy: Italian Neorealism in the Light of Greek Tragedy”. Disponível em: http://www.thefreelibrary.com/Cinematic+traces+of+participatory+democracy+in+early+postwar+Italy%3A…-a0218658340. Acessado em: 25 de fevereiro de 2021.

    SARRAZAC, “Jean-Pierre. Léxico do drama moderno e contemporâneo”. 1ª Edição Eletrônica. COSACNAIFY. São Paulo, 2013.

    TORRANO, Jaa. “O mito de Dionísio”. In: EURÍPEDES, “Bacas: O mito de Dionísio”. São paulo: Editora Hucitec, 1995.

    TRIAU, Christophe. “Coralidades difratadas: a comunidade em negativo”. Alternatives théátrales p. 11, 20