Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Márcio Câmara (UFPE)

Minicurrículo

    Bacharel em Artes no Cinema pela San Francisco State University (SFSU) (1993) é Mestre em Comunicação, com ênfase nos Estudos de Som no Cinema, pela Universidade Federal Fluminense (UFF) (2013) e Doutorando no Programa Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) com pesquisa sobre o Som no Cinema. Técnico de Som Direto, Realizador Audiovisual e Professor do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza (UNIFOR).

Ficha do Trabalho

Título

    As escolas sonoras americana e francesa: origem, tradição e hibridismo

Seminário

    Estilo e som no audiovisual

Resumo

    O artigo pretende apresentar uma pesquisa em desenvolvimento que busca refletir sobre o surgimento e constituição de duas “escolas sonoras”: a americana e a francesa. Procura definir seus pontos distintos e também convergentes, explorando as interferências dessas escolas na sonoridade de outras cinematografias.

Resumo expandido

    Na pesquisa de mestrado intitulada O Som Direto no Cinema Brasileiro: entre a criatividade e a técnica (CÂMARA, 2019), quando analisei as atuações criativas de Técnicos de Som Direto no cinema brasileiro contemporâneo, por meio de uma historiografia sonora, era recorrente ouvir comentários sobre a influência que duas “escolas sonoras” – a francesa e a americana – tiveram no som cinematográfico feito no Brasil. Para as pessoas entrevistadas na pesquisa havia uma declarada sonoridade advinda da maneira como escutamos os filmes feitos na França e nos Estados Unidos, delimitando uma maneira específica de ouvir o mundo: a americana que priorizaria o som em close, em detrimento do espaço onde os personagens estão inseridos, e a francesa que enfatizaria o som do espaço junto com a ação.
    Parto da interseção entre som e imagem para entender a origem das citadas escolas: a transição do cinema silencioso para o falado, período que começa em 1927 e vai até 1934, sendo que em alguns países esse tempo foi mais estendido, como no caso do Japão que foi até 1940 (FREIBERG, 1987). Uma das primeiras distinções que pode ser escutada na sonoridade dos filmes feitos nesses dois países é que nos Estados Unidos se enfatizava a inteligibilidade da fala dentro da história da trama do filme. Já a realidade francesa enfatizava um modelo alternativo onde o som servia para reproduzir uma performance dos atores, geralmente vindos diretamente do rádio ou do teatro, sendo os filmes franceses desse período feitos como extensão dessas outras atividades (O’BRIEN, 2005). Essa tradição se estendeu para o Brasil com filmes como Alô, alô carnaval (1936) de Adhemar Gonzaga, quando as cantoras e cantores de rádio inundaram a tela do cinema brasileiro, aproveitando o já reconhecimento do público (COSTA, 2008).
    Importante notar também a divergência técnica do cinema francês para o cinema americano quando a estandardização de procedimentos de regravação e outras técnicas de gravação multi-pista só ocorreram na França nos anos 1940, durante a ocupação alemã – uma década depois de Hollywood -. Mesmo assim, naquele período, o som direto manteve-se extremamente comum na história do cinema francês (LASTRA, 2000).
    Aponto ainda para o período da metade dos anos 1950 para o começo dos anos 1960 como decisivo para investigar as diferenças entre uma escola e a outra. Nessa confluência tivemos a introdução de aparatos de gravação leve, com câmeras como a Cameflex e o gravador de som Nagra, que se estabeleceu como norma até o final dos anos 1980 (PUCCINI, 2017). Esses novos instrumentos de trabalho viabilizaram, através da liberdade de filmar, novas maneiras de significar e entender o mundo, sendo o gênero documentário o que logo abraçou essa oportunidade. Enquanto que o método francês – cinema vérité – registrava as interações entre o cineasta e o objeto filmado, o americano tentava mostrar o cotidiano dos atores sociais retratados por meio de uma interferência mínima – direct cinema – (MAMBER, 1974). Nessas duas vertentes estéticas o uso do som imprimiu um diferencial e as diferentes práticas ajudaram a consolidar o som como parte importante, em muitos casos, imprescindível, do processo audiovisual. No caso francês, o Grupo Sincrônico Rápido afirmava em manifesto: “temos que filmar para o som!” (RUSPOLI, 1963), acentuando a proposta de som político que Caroline Zéau aponta no trabalho sonoro de Antonie Bonfanti e sua escuta como um compromisso com a verdade. No caso oposto, segundo relatou o Técnico de Som Direto Romeu Quinto durante sua entrevista: “o som americano é o som da mentira!” (CÂMARA, 2019).
    A identificação dessas duas sonoridades, suas intervenções nas diversas cinematografias mundiais e a representação dessas influências na realidade sonora do cinema brasileiro, nos dois períodos históricos propostos, são focos do meu doutorado. Intenciono, assim, problematizar a intervenção de uma escola ou outra, ou mesmo um modelo híbrido que utiliza das duas sonoridades.

Bibliografia

    CÂMARA, Márcio. Som Direto no Cinema Brasileiro: fragmentos de uma história. Fortaleza: Editora RDS, 2º edição, 2019.

    COSTA, Fernando Morais da. O som no cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Editora 7Letras, 2008.

    FREIBERG, Freda. The Transition to Sound in Japan. History on/and/in Film. Perth: History & Film Association of Australia, 1987.

    LASTRA, James. Sound technology and the American cinema: perception, representation, modernity. New York: Columbia University Press, 2000.

    PUCCINI, Sérgio. Antoine Bonfanti e a escuta do mundo em documentários não controlados. Doc On-line, n. 22, setembro de 2017.

    MAMBER, Stephen. Cinema verite in America, studies in uncontrolled documentary. Cambridge: The MIT Press. 1974.

    O’BRIEN, Charles. Cinema’s conversion to sound: technology and film style in France and the U.S. Bloomington: Indiana University. Press, 2005.

    RUSPOLI, Mario. Le group synchrone léger. Unesco, 1963.