Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Demian Albuquerque Garcia (UPJV – UNESPAR)

Minicurrículo

    Demian Garcia é doutorando em Cinema na UPJV, professor do curso de Cinema e Audiovisual da UNESPAR. Sua pesquisa se concentra na construção de emoções através do som no cinema japonês. Seus centros de interesse são: a escritura sonora, cinema de horror e cinema japonês. Integra o Laboratório de Pesquisa CRAE, UPJV, França; e os grupos de pesquisa Kinedária: arte, poética, cinema, vídeo (Unespar/CNPq) e LAPIS – Laboratório de Pesquisa de Imagens e Sons (UFPE/CNPq). www.demiangarcia.net

Ficha do Trabalho

Título

    Entre os ruídos e a música – a fronteira indefinida no cinema japonês

Seminário

    Estilo e som no audiovisual

Resumo

    O cinema japonês nutre uma relação particular com sua cultura tradicional, e o cinema contemporâneo é marcado por essa ligação histórica. Se em Ring, Hideo Nakata pede ao seu compositor uma música sem melodia, K. Kurosawa utilisa sons da natureza e da tecnologia para indicar a presença da morte – o som da conexão internet vira o leitmotiv do fantasma. Essa comunicação quer explorar essa fronteira indefinida entre o design sonoros e música na construção de emoções nos filmes de fantasmas.

Resumo expandido

    O cinema japonês nutre uma relação particular com o som e a música ligada à sua cultura tradicional, e o cinema de fantasmas contemporâneo fica marcado por essa ligação histórica. Por exemplo, em Ringu (1998) o diretor Hideo Nakata pede ao seu compositor, Kenji Kawai, para criar uma música sem melodia, que funcionará como efeitos sonoros. Chiados estridentes e guinchos aparecem para despertar o terror do espectador cada vez que a fita VHS for lançada ou que a presença de Sadako for sentida. As flautas e tambores tradicionais do teatro kabuki, que anunciam a presença dos fantasmas nos kaidan eiga (filmes de fantasma clássicos), são transformados em rangidos agudos e drones muito graves. A música e alguns efeitos sonoros pontuais são normalmente extra-diegéticos nos filmes de horror, mas aqui, eles vem também da diegése: o som do vídeo maldito, da conexão internet, do telefone que toca, de sons guturais de garganta, de miados de gatos, gritos, do vento, da chuva, etc. A música se transforma em camadas sonoras que navegam entre sons da natureza e da tecnologia. Em Kiyoshi Kurosawa os ruídos de água, da floresta e do vento indicam a presença da morte e perturbam os pensamentos dos protagonistas. Em Kairo (2001), o som da conexão internet se torna o leitmotiv do fantasma/vírus que se espalha pela sociedade ‘Tokyoita”. Kurosawa utiliza sons diegéticos – como som de cortinas de plástico, computadores e até uma máquina de lavar – para criar a sonoridade das cenas e construir a emoção no público. O drone é muito usado no cinema de horror ocidental para criar tensão, mas no Japão ele possui camadas suplementares: primeiramente sua ligação com os tambores do kabuki que produzem uma sonoridade grave e contínua para anunciar eventos sobrenaturais, mas também evocando os terremotos, que para os japoneses lembram aqueles que realmente aconteceram, como o de 1995 em Kobe – esse fenômeno natural aparece em alguns filmes de Kurosawa, como Cure de 1997 e Retribuição de 2006. Muitas vezes os sons do cotidiano se transformam em uma peça de música concreta, como já prenunciado por Tōru Takemitsu em Kwaidan, de Masaki Kobayashi em 1964.
    Embora os elementos sonoros dos filmes japoneses de fantasmas sejam, em grande parte, os mesmos do cinema ocidental, sua utilização é diferente. Os filmes japoneses perpetuam, em sua relação com o som, uma tradição que remonta ao teatro kabuki onde as fronteiras entre música e efeitos sonoros já eram confusas. Essa singularidade se baseia em questões culturais : o som não se mixa da mesma forma, as referências se apoiam em um imaginário próprio, consequentemente a escritura sonora é construída de forma diferente, e a isso se acrescenta uma representação do fantasma fundamentalmente peculiar à cultura japonesa, pois ela foi estruturada de maneira totalmente distinta (as religiões, as relações com os espíritos, a história, as crenças, etc)
    Essa comunicação quer explorar a maneira com que os diretores, compositores e designers de som japoneses constroem uma escritura sonora que faz dialogar a composição musical e a criação sonora nos filmes de fantasmas, e a fronteira indefinida dos elementos sonoros, que se articulam, se desdobram, se misturam, se fundem e se confundem.

Bibliografia

    BARNIER Martin, « Kiyoshi Kurosawa et les sons fantomatiques », Cinémaction – « Cinéma d’Asie orientale », n°128, Corlet Publications, 2008, p. 122 129.
    DU MESNILDOT Stéphane, Fantômes du cinéma japonais: les métamorphoses de Sadako, Pertuis, Rouge profond, 2011.
    GARCIA Demian, « O Simbolismo da música do teatro kabuki e o cinema de fantasma no Japão », Estilo e Som no Audiovisual, São Paulo, Socine, 2018, p.125-139.
    LEITER Samuel L. et YAMAMOTO Jirō, New kabuki encyclopedia: a revised adaptation of Kabuki jiten, Westport, Conn, Greenwood Press, 1997.
    NAKATA Hideo et KAWAI Kenji, Interview in « DVD Ring », Studio Canal, 2001.
    RICHIE Donald, SLOCOMBE Romain et SCHRADER Paul, Le cinéma japonais, Paris, Éd. du Rocher, 2005.