Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    GUILHERME HENRIQUE ANTONIO (UNESP)

Minicurrículo

    Doutorando em Comunicação pela UNESP, desenvolvendo pesquisa sobre as produções midiática do Leste Asiático. Mestre pelo Programa de Comunicação -FAAC / UNESP (Bauru), na àrea de produção de sentido em mídias comparadas. Professor-bolsista nos cursos de Jornalismo e Relações Públicas na UNESP-BAURU. Bacharel em Letras: Português-Mandarim pela FFLCH-USP.

Ficha do Trabalho

Título

    A cidade e o corpo: considerações sobre Rebels of the Neon God (1992)

Resumo

    Este artigo se apresenta como um ensaio do filme Rebels of the Neon God (1992), de Tsai Ming-Liang. As produções do diretor chamam atenção por seu caráter autoral, pela intertextualidade e por seu diálogo com questões da modernidade. Tsai repensa a relação do observador com o cinema, convidando-o a refletir, além de apresentar soluções narrativas que tornaram-se marcas do diretor. Este artigo contribui para os produções
    cinematográficas, principalmente no que tange às produções asiáticas.

Resumo expandido

    Tsai Ming-Liang debuta no cinema nos apresentando uma Taipei em pleno movimento e
    como essa cidade é vívida e sentida por três jovens. O filme de 1992 Rebels of the Neon God,
    nome em inglês para o título 青少年哪吒 (ou Jovem Nezha em tradução literal), retrata a
    camada média da juventude de Taipei que se percebe vazia de objetivos e desejos enquanto
    vagam pelas ruas de uma noturna e chuvosa Taipei, iluminada pelo farol das motocicletas e
    letreiros de neon.
    A possibilidade do cinema de captar e suspender a efemeridade de momentos e emoções
    convidam o observador a experienciar uma Taipei que se reconfigura em novos componentes
    perceptivos. Nessa obra o diretor discute o efeito das transformações urbanas que ocorrem com
    grande intensidade nas cidades asiáticas, desde os anos 40 e principalmente a partir dos anos 70
    em seus habitantes e também à forma como o cinema, capaz de registrar e preservar um espaço
    em desaparecimento, se relaciona com tais mudanças. Essa dinâmica de transformações afinadas
    com o espaço urbano abarca corpos, signos, linguagens relações e até mesmo o próprio
    observador.
    A proposta deste artigo é discutir o papel do observador na obra Rebels of the Neon God
    em dois níveis: o observador diegético, voyeur, representado pelo personagem Hsiao Kang (Lee
    Kang-sheng); e nós observadores não-diegéticos, que observamos aquele que observa e apontar
    relações entre essas duas instâncias. Além disso, levando-se em conta a revalorização do cinema como uma arte espacial, e partindo de uma categorização do espaço como algo dinâmico, definido acima de tudo pela mobilidade, este artigo procura identificar a relação entre espaço, tempo e memória no filme Rebels of the Neon God, traçando um paralelo entre a efemeridade da cidade e a efemeridade do cinema, à luz de
    suas constantes mutações.
    Algumas leituras possíveis foram e deveriam ter sido feitas sobre esse vertiginoso
    maelstrom de desejo, sexo, arependimento e meditação sobre a decadência da carne e da alma
    dos personagens de Tsai. O caráter ilusório do desejo e a natureza transitória da vida humana
    fazem com que a inocência se perca em uma multiplicação de decepções contemporâneas e uma
    vida.
    Frequentemente referenciados como excêntricos ou estranhos, esses personagens, cujo
    comportamento flerta com manias peculiares e grande fisicalidade, desafiam premissas
    normativas de condutas privadas e categorias fixadas de identidades e subjetividade. Os
    comportamentos por vezes inexplicáveis contrariam os modelos de normalidade, seus
    personagens agem como as pessoas geralmente se comportam ( mas raramente são representadas
    se comportando) quando estão sozinhas, ou seja estranhamente.
    Nos filmes de Tsai, o comportamento bizarro de seus personagens confunde qualquer tentativa
    de explicá-los. Esses personagens solitários são constantemente representados em suas casas,
    limitados por janelas, portas e espelhos, quase que emoldurados.
    Além de delimitar o espaço dos personagens, portas, janelas e paredes são objetos que
    fracionam ou expandem o espaço doméstico em variados planos, oferecendo múltiplos focos de
    atenção na mesma cena.
    O cinema de Tsai Ming-Liang nos oferece várias perspectivas de espaço e tempo, não se
    limitando à dimensão física.
    Os protagonistas de seu filme transitam na fronteira entre suas singularidades e os
    modelos sociais mais provavelmente estabelecidos como nação, comunidade, família,
    capitalismo e até heterossexualidade.
    Não há nada de típico e normativo em seus filmes, eles sempre encenam uma jornada
    para o novo, a criação do sentido contra o bom senso, contra a ética, moralidade e normalidade.
    Nossa condição pós-moderna desencadeia uma reação contra a pressão efetuada pela
    implementação da globalização de uma temporalidade universal que apaga imaginações
    alternativas e temporalidades com ritmos diferentes. Através de seus personagens, seus espaços e sua
    temporalidade, Tsai aponta em nós o que escondemos dos outros e de nós mesmos.

Bibliografia

    BARTHES, Roland. A câmara clara: nota sobre fotografia: tradução de Julio Castañon
    Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
    BRAESTER, Yomi. If We could Remember Everything, We could be able to fly: Taipei’s
    Cinematic Poetics of Demolition, In: Modern Chinese Literature and Cinema, Vol 15, n.1, 2003,
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    CHARNEY, Leo; SCHWARTZ, Vanessa R. O cinema e a invenção da vida moderna. Trad.
    Regina Thompson. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
    CRARY, Jonathan. Técnicas do observador: visão e modernidade no século XIX. Trad. Verrah
    Chamma. Rio de Janeiro: Contraponto,2012.
    ELSAESSER, Thomas. Cinema como arqueologia das mídias. Trad. Carlos Szlak. São Paulo:
    Edições Sesc, 2018. p. 72-102.
    FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; Tradução de Raquel Ramalhete.
    Petrópolis, Vozes, 1987.
    HAN, Byung-Chul. A Salvação do belo; Tradução de Gabriel Salvi Philipson. – Petrópolis, RJ:
    Vozes, 2019.