Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Camila Macedo Ferreira Mikos (UFPR)

Minicurrículo

    Camila Macedo é doutoranda e mestra em Educação pela Universidade Federal do Paraná, bacharela em Cinema e Vídeo pela Universidade Estadual do Paraná e integrante do GILDA – Grupo Interdisciplinar em Linguagem, Diferença e Subjetivação (UFPR/CNPq). Atua nas áreas de pesquisa, curadoria e realização em cinema. Junto a Débora Zanatta, coordena a programação do Sesi Cineclube Solax (Curitiba-PR). Desde 2018, integra a equipe de curadoria do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.

Ficha do Trabalho

Título

    Lésbicas racializadas e o “final feliz” em filmes de amadurecimento

Seminário

    Cinemas mundiais entre mulheres: feminismos contemporâneos em perspectiva

Resumo

    Derivado de uma pesquisa de doutorado em andamento, este trabalho é disparado pela pergunta: sob que circunstâncias um futuro feliz desponta no horizonte de jovens protagonistas lésbicas e racializadas em longas-metragens que entrecruzam códigos narrativos de filmes de amadurecimento e de “saída do armário”? Propondo uma aproximação da problemática que desde aí se decanta, as noções de temporalidade normativa (Halberstam, 2005) e de teleologia da felicidade (Ahmed, 2010) são postas em operação.

Resumo expandido

    Em texto originalmente publicado em 1980, “Heterossexualidade compulsória e existências lésbica” (2019), Adrienne Rich define o apagamento da existência lésbica nas imagens e narrativas do cinema como uma das muitas formas de impor a heterossexualidade às mulheres, dissipando um imaginário capaz de dar esteio a outras formas de vida e de subjetivação que não a heterossexual.
    Em artigo mais recente, intitulado “A in/visibilidade lésbica no cinema” (2019), Alessandra Soares Brandão e Ramayana Lira de Souza retomam a problemática da (des)aparição lésbica em filmes através de uma outra chave de compreensão, delineada pelas autoras como um paradoxo da in/visibilidade, isto é: se, por um lado, as imagens da lésbica pouco ou nada aparecem no cinema, por outro, “[…] essa mesma invisibilidade pode ser entendida como a imagem de uma latência ou de uma ausência, a cada instante pronta para ser (de)codificada.” (BRANDÃO; SOUZA, 2019, p. 280).
    Das inúmeras maneiras possíveis de operar a desaparição das lesbianidades nos filmes – mesmo naqueles em que a aparição lésbica se faz momentaneamente bem definida e delimitada -, talvez a morte trágica, frequentemente decorrente do suicídio, seja a mais reiteradamente utilizada, reforçando um enquadramento de culpa e punição para as imagens da existência lésbica.
    Por consequência, em especial a partir da década de 1990, embates e reivindicações a respeito de representações mais “positivas” e menos infelizes das lesbianidades têm ecoado e produzido efeitos nas realizações cinematográficas. Assim, a construção de um imaginário de “final feliz” para personagens lésbicas está, em alguma medida, implicada nas dinâmicas de aparição e visibilização das lesbianidades no cinema contemporâneo.
    Mas se, como afirmam Brandão e Souza, “[…] o regime do visível hoje nos permite um encontro menos raro com as lésbicas no cinema” (2019, p. 284), exigindo-nos, em decorrência, “[…] instrumentos cada vez mais sofisticados para a análise das imagens” (2019, p. 284), faz-se igualmente necessário que possamos nos inquietar diante das imagens de felicidade que acompanham tais encontros, olhando com desconfiança para assunções apressadas de que o abandono de finais trágicos seria de todo capaz de nos oferecer filmes menos marcados pela norma heterossexual.
    É nesse sentido que este trabalho, derivado de uma pesquisa de doutorado em andamento, mobiliza-se pela pergunta: sob que circunstâncias um futuro feliz desponta no horizonte de jovens protagonistas lésbicas e racializadas em longas-metragens contemporâneos, tais quais os estadunidenses “Você nem imagina” (2020, dir: Alice Wu), “Pária” (2011, dir: Dee Rees) e “Mosquita y Mari” (2012, dir: Aurora Guerrero)? Como os marcadores de gênero, raça e sexualidade se imbricam na constituição de sequencialidades de vida que deem contorno à experiência juvenil vivida pelas personagens nesses filmes? E quais regimes normativos estabelecem determinados objetos como promissores ou não de felicidade em suas trajetórias?
    Para tanto, recorro à análise da articulação entre códigos narrativos de filmes de amadurecimento (“coming of age”) e de “saída do armário” (“coming out”), tomando as noções de temporalidade normativa (Halberstam, 2005) e de teleologia da felicidade (Ahmed, 2010) como ferramentas a partir das quais se pode mirar as histórias de Ellie Chu (interpretada por Leah Lewis em “Você nem imagina”), Alike (interpretada por Adepero Oduye em “Pária”) e Yolanda (interpretada por Fenessa Pineda em “Mosquita y Mari”).

Bibliografia

    AHMED, Sara. The promise of happiness. 1 ed. Durham and London: Duke University Press, 2010.

    BRANDÃO, Alessandra Soares; SOUZA, Ramayana Lira de. A in/visibilidade lésbica no cinema. In: HOLANDA, Karla. (org.). Mulheres de cinema. Rio de Janeiro: Numa Editora, 2019.

    HALBERSTAM, J. In a queer time and place: transgender bodies, subcultural lives. 1. ed. Nova Iorque: New York University Press, 2005.

    KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. 1. ed. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.

    MONAGHAN, Whitney. “‘It’s all in a day’s work for a 15-year-old gay virgin’: Coming Out and Coming of Age in Teen Television”. Colloquy: Text Theory Critique, Vol. 19, 2010, 56-69.

    RICH, Adrienne. Heterossexualidade Compulsória e Existência Lésbica & outros ensaios. Rio de Janeiro: A Bolha, 2019.