Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Arthur Autran Franco de Sá Neto (UFSCar)

Minicurrículo

    Professor da UFSCar desde 2002. É bolsista PQ Nível 2 do CNPq. Doutorou-se no Instituto de Artes da Unicamp e fez pós-doutorado na Universidade de Buenos Aires. Publicou os livros Alex Viany: crítico e historiador (2003), Imagens do negro na cultura brasileira (2011) e O pensamento industrial cinematográfico brasileiro (2013), bem como colaborou na Enciclopédia do cinema brasileiro (orgs. F. Ramos e L. F. Miranda, 2012). Dirigiu o documentário A política do cinema (2011).

Ficha do Trabalho

Título

    História do cinema & sociedade: as ideias de Jean-Claude Bernardet

Seminário

    Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência

Resumo

    Esta comunicação versa sobre um dos aspectos mais instigantes da produção historiográfica de Jean-Claude Bernardet: a análise crítica de filmes canônicos da história do cinema brasileiro visando o alargamento da compreensão da nossa sociedade.
    Ao longo dos anos 1970 e 1980, todo um esforço foi construído por este autor para indicar, por meio de diversos ensaios, como filmes produzidos nas primeiras décadas do século XX reverberam aspectos ideológicos, conflitos e impasses da sociedade.

Resumo expandido

    Esta proposta de comunicação versa sobre um dos aspectos mais instigantes e inovadores da produção historiográfica de Jean-Claude Bernardet: a análise crítica de filmes canônicos da história do cinema brasileiro visando alargar a compreensão da nossa sociedade, principalmente em relação ao horizonte ideológico dominante em determinado período, aos impasses políticos e aos conflitos sociais.
    Se hoje este tipo de análise é recorrente e vem sendo realizada com grande maestria por historiadoras como Flávia Cesarino Costa, Luciana Corrêa de Araújo e Sheila Schvarzman, o mesmo ainda não ocorria até o início dos anos 1970, quando obras produzidas em períodos mais recuados no tempo e consideradas como pertencentes ao panteão da história do cinema brasileiro não eram discutidas ideologicamente mesmo por autores de esquerda. Basta-se ver o cuidado de Alex Viany e Paulo Emílio Sales Gomes, nos seus textos dos anos 1950 e 1960, em não abordar o flagrante conservantismo social de boa parte das fitas de ficção realizadas até os anos 1930.
    Ao longo dos anos 1970 e 1980, todo um esforço foi empreendido por Jean-Claude Bernardet para interrogar filmes canônicos, mas sem que a análise soterrasse a obra e o seu contexto de realização.
    Um dos primeiros passos nesta direção foi o curto, mas significativo texto datado de 1971 sobre Aves sem ninho (Raul Roulien, 1939), no qual Bernardet se interroga sobre a representação da liderança política e da sua relação com a massa. Igualmente importante são algumas notas sobre a representação do populismo em Nem Sansão nem Dalila (Carlos Manga, 1954), em um momento no qual os discursos historiográficos a respeito da chanchada limitavam-se ou a criticar a fatura de tais produções ou a elogiar o contato destes filmes com o grande público.
    Mas é no texto “A cidade, o campo” que encontramos uma riquíssima discussão acerca de como, ao longo da história, o cinema brasileiro representou estes dois espaços, bem como a transição entre eles. Desta forma, Bernardet demonstra como o cinema brasileiro, com todas as suas limitações, expressou uma das questões centrais para o país no século XX.
    Também merece destaque a forma como Bernardet abordou, em mais de um texto, a representação do operário. Especialmente a discussão em torno de um projeto não realizado de José Medina, intitulado Luzes que se apagam, aponta para o viés reacionário da produção cinematográfica dos anos 1920 no Brasil – sem esquecer de relacionar isso à dominação enfrentada pelos cineastas nas suas relações com as elites da época.
    É necessário observar que a análise ideológica das obras não era uma novidade implementada por Bernardet. Críticos como Alex Viany procederam este tipo de discussão de forma intensa desde os anos 1950, mas se limitando ao que percebiam como o cinema contemporâneo e não em relação ao passado mais distante. Desta forma, na Introdução ao cinema brasileiro, Viany comenta acidamente um filme como Caiçara (Adolfo Celi, 1950), mas não faz o mesmo quanto a Fragmentos da vida (José Medina, 1929).
    Note-se que Bernardet publicou em 1967 uma obra que se tornou fundamental e na qual fazia uma profunda análise ideológica do Cinema Novo: Brasil em tempo de cinema. Mas se tratavam de filmes contemporâneos ou vistos enquanto tais pelo autor do livro. A partir dos anos 1970, o seu trabalho de fina análise ideológica amplia-se para obras do passado mais distante, por vezes consideradas canônicas.
    Na comunicação buscar-se-á também relacionar outros autores cujo trabalho analítico parece ter alguns rebatimentos com Bernardet. É o caso, por exemplo, de Antônio Cândido e de Roberto Schwarz, em especial, no caso do primeiro, o artigo ”Dialética da malandragem”, e, no caso do segundo, o livro Ao vencedor as batatas. Historiadores do cinema estrangeiros também serão trazidos para discussão, com destaque para Noël Burch e Carlos Monsiváis.

Bibliografia

    BERNARDET, Jean-Claude. Brasil em tempo de cinema. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 1967.
    _____. Trajetória crítica. São Paulo: Polis, 1978.
    _____. A cidade, o campo. In: In: AA. VV. Cinema brasileiro: 8 estudos. Rio de Janeiro: Embrafilme / Funarte, 1980. P. 137-150.
    _____. Cinema brasileiro: propostas para uma história. 2 ed. rev. ampl. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
    BURCH, Noël. La lucarne de l´infini. Paris: Nathan, 1991.
    CÂNDIDO, Antônio. Dialética da malandragem. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 8, jun. 1970. P. 67-89.
    MONSIVÁIS, Carlos. Del rancho al internet. México: Instituto de Seguridad y Servicios Sociales de los Trabajadores del Estado, 1999.
    LAGNY, Michèle. De l’histoire du cinéma – Méthode historique et histoire du cinéma. Paris: Armand Colin, 1992.
    SCHWARZ, Roberto. Ao vencedor as batatas. 4 ed. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1992.
    VIANY, Alex. Introdução ao cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1