Trabalhos Aprovados 2021

Ficha do Proponente

Proponente

    Wendell Marcel Alves da Costa (USP)

Minicurrículo

    Doutorando em Sociologia pelo PPGS da Universidade de São Paulo. Pesquisa temas da cultura cinematográfica que tratam das mudanças espaciais, sonoras e estéticas da cidade no cinema contemporâneo. Associado da Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual, Associação Brasileira de Antropologia e da Sociedade Brasileira de Sociologia. É integrante do Grupo de Pesquisa Linguagens da Cena: imagem, cultura e representação.

Ficha do Trabalho

Título

    Leituras bachelardianas em Me Chame Pelo Seu Nome

Resumo

    Neste trabalho analiso a potência poética e imaginária da água e do fogo no filme Me Chame Pelo Seu Nome. A partir do olhar bachelardiano dos elementos naturais que falo acerca da trama cinematográfica e como eles servem como signos alegóricos de sentimentos, como os desejos de Elio e o medo de Oliver. Repleto de símbolos e alegorias sobre os sentimentos/pensamentos dos personagens, o filme representa ideias e vontades, utilizando-se de imagens poéticas para remeter ao imaginário social.

Resumo expandido

    Me Chame Pelo Seu Nome (Luca Guadagnino, 2017) foi um filme esperado. A obra melodramática possui personagens enigmáticos e os lugares em que a história se passa é um local de significação para os acontecimentos da história. Este trabalho faz uma leitura bachelardiana com base em uma análise fílmica de um filme potente, repleto de símbolos e alegorias dos sentimentos e pensamentos dos personagens.

    Gaston Bachelard, autor central deste trabalho, é um filósofo que discute em seus livros a água, o fogo, a terra e o ar como substâncias oníricas do pensamento poético e imaginativo. Em sua perspectiva, a água e o fogo reservam o imaginário do mundo e das coisas, contem poeticidade e veiculam sentidos sobre a materialidade dos objetos. Para nós, sua teoria da poética das imagens (BACHELARD, 1998, 1988, 1993, 1994, 1989) pode contribuir para interpretar a dimensão simbólica e imaginativa com que o filme de Luc Guadagnino representa sentimentos e ideias sobre o mundo e as coisas.

    Esta hipótese de trabalho é um procedimento adotado desde o mestrado em Antropologia Social, e segue no doutorado em Sociologia, com a intenção de fazer uma pesquisa socioantropológica de envergadura filosófica em filmes de ficção (CABRERA, 1999). De fato, é revelante requerer uma abordagem interdisciplinar com objetos empíricos simbólicos, sociais e políticos, e as Ciências Sociais podem servir como campo de interpretação das construções dos mundos imaginários nos filmes de ficção (MARTINS, ECKERT, NOVAES, 2005).

    De forma resumida, o longa-metragem de Guadagnino, roteirizado por James Ivory, conta a história de Elio, um jovem que vive com seus pais no norte da Itália. O filme se passa no ano de 1983, e mostra a cultura italiana da época, as pessoas e os costumes, o idioma e as misturas com outras línguas e nacionalidades, a paixão por literatura, música, cinema, escultura, história e culinária da família de Elio. Com a chegada de Oliver, muita coisa muda. Sua persona simpática e enigmática, arrogante e presunçosa encanta tanto os pais de Eliot como o próprio menino e os moradores da região.

    É nesse cenário que o filme explora situações como a descoberta da sexualidade, os sonhos de vida, a Beleza e a existência dos personagens. O filme adota elementos como imaginação, onírico e poética a partir da construção da narrativa e do jogo com figuras arquetípicas e simbólicas da humanidade. Por exemplo, as esculturas que Oliver e o professor Perlman catalogam por semanas, na casa e no mar, repercutem a imagem de sensualidade e sexualidade. A maioria das esculturas mostradas no início do filme e nas chapas analisadas por Oliver e Perlman são de homens gregos, nus, com músculos esculpidos com perfeição. Há um apelo metafórico ao sexo remetendo à sexualidade dos homens das esculturas, trazendo a juventude como o tempo do ápice sexual. Elio entra constantemente como o exemplo humano de representação das esculturas gregas; sempre sem camisa, com traços atenienses, cabelos longos e pretos, é um espelho real daquilo que o professor e o assistente estudam, a escultura de outro tempo.

    Nesse sentido, a escultura é apenas um dos muitos elementos escolhidos para consubstanciar a trama do filme, assim como a presença quase literal da literatura nos diálogos, a música clássica e original de Sufjan Stevens na trilha sonora, comentários sobre cinema na mesa de jantar. Aqui, quero relatar sobre a potência poética e imaginária da água e do fogo, elementos sempre presentes em Me Chame Pelo Seu Nome, como nas cenas dos rios, do mar, das bebidas e da fogueira e da chama da chaminé. É desse olhar bachelardiano dos elementos naturais que falo acerca da trama cinematográfica e como eles servem como signos alegóricos de sentimentos, como os desejos de Elio e o medo de Oliver, os dois protagonistas, dentre outras especialidades contextuais referentes aos espaços da casa e da cidade representadas no longa-metragem.

Bibliografia

    BACHELARD, Gaston. A água e os sonhos: ensaio sobre a imaginação da matéria. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
    BACHELARD, Gaston. A poética do devaneio. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
    BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
    BACHELARD, Gaston. A psicanálise do fogo. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
    BACHELARD, Gaston. A chama de uma vela. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
    CABRERA, Julio. O cinema pensa: introdução à Filosofia através dos filmes. RJ: Rocco, 1999.
    MARTINS, José de Souza. ECKERT, Cornelia. NOVAES, Sylvia Caiuby. O imaginário e o poético nas Ciências Sociais. Bauru: EDUSP, 2005.