Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Julia Gonçalves Declié Fagioli (UFMG)

Minicurrículo

    Julia Fagioli é doutoranda do Programa de Pós Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais, da linha de pesquisa Pragmáticas da Imagem, sob orientação do Prof. André Brasil. É mestre pela mesma instituição.

Ficha do Trabalho

Título

    Tomada e retomada, militância e ensaio no cinema de Chris Marker

Seminário

    O comum e o cinema

Resumo

    No cinema de Chris Marker não é possível separar o cineasta militante do ensaísta. O cinema militante se aproxima do momento da tomada, enquanto o cinema ensaísta remete à retomada. O que buscamos aqui é compreender de que modo esses dois gestos se aproximam e, ainda, pensar a forma como abriga olhares múltiplos em seu cinema, revelando o caráter ao mesmo tempo militante e ensaísta em quatro filmes: Le joli mai (1962), Até logo, eu espero (1967), O fundo do ar é vermelho (1977) e Sem sol (1983).

Resumo expandido

    Em Le joli mai (Chris Marker, 1962) podemos apreender certa linguagem adotada por Chris Marker para tratar das questões políticas. Dedicando-se ao mês de maio de 1962 em Paris, quando do primeiro cessar fogo após a guerra da Argélia, o filme compõe-se, em sua maior parte, de entrevistas – o que, por sua vez, indica a forma de trabalhar de Marker no período de militância. Nos anos seguintes, se dedicou aos coletivos cinematográficos: em 1967, junto com Mario Marret, Marker dirige um filme que contribuiria para mudar a forma de se fazer cinema militante até então. Até logo, eu espero (1967) foi produzido pelo SLON – do francês Société pour le lancement des ouvres nouvelles – um grupo criado para fazer a distribuição do projeto Longe do Vietnã (1967). Após a repercussão de Até logo, eu espero, Marker reúne um grupo de realizadores e técnicos para ensinar aos trabalhadores de Besançon a utilizarem os equipamentos e produzirem seus filmes; durante seis meses, eles se reúnem à noite e nos fins de semana; assim surgiram os Groupes Medvedkines (GRANT, 2011). Desde Le joli mai, já percebemos uma linguagem ensaística, reforçada pelas estratégias de montagem e, ao mesmo tempo, um engajamento nas questões que escolhe tratar, buscando pontos de vista diversos e muitas vezes conflitantes. Se a princípio as entrevistas eram a forma de expor os pensamentos em sua multiplicidade, com os Groupes Medvedkines Marker entrega a câmera aos operários para que eles possam produzir um pensamento próprio através das imagens. A partir de uma abordagem teórica e histórica do cinema militante podemos perceber que, no cinema de Chris Marker, não é possível separar o cineasta militante do ensaísta e montador. O cinema militante se aproxima mais do momento da tomada, se relaciona à urgência na produção de uma imagem diante de um momento crítico, enquanto o cinema ensaísta remete à retomada, momento de recontextualização e de distanciamento das imagens. Marker se envolveu de forma muito intensa com o cinema militante nos anos 1960 e 1970 e a realização de O fundo do ar é vermelho, em 1977, fecha esse ciclo na carreira do diretor, para dar lugar a um cinema ensaístico, como aquele que vemos em Sem sol ou Level Five. Na maior parte da bibliografia sobre a obra de Marker, há uma tendência de separação entre o período de produção militante do período ensaísta (COOPER, 2008; LUPTON, 2005). O que defendemos aqui é que tal separação não pode ser feita, pois há, já no cinema militante, um pensamento que atravessa a montagem, o momento da urgência, de modo que, na tomada, as imagens já possuem um gesto reflexivo. E, do mesmo modo, nos filmes posteriores, o cineasta militante não desaparece, ele está sempre presente nas motivações para a realização dos mesmos. O que buscamos aqui é compreender de que modo esses dois gestos – a tomada e a retomada – se aproximam. Ou seja, buscamos compreender como a tomada é concebida – que tipo de pensamento se manifesta em uma imagem militante? Como a circunstância da militância produz um pensamento que é dado a ver na imagem? O que propomos é que se trata de convocar as imagens em um acolhimento da multiplicidade de pontos de vista; um pensamento compartilhado que propiciaria a construção de um pensamento próprio do diretor. Ao mesmo tempo, é preciso apreender as formas de engajamento que permanecem presentes no trabalho de montagem das imagens, quando há um gesto ensaístico mais forte, mas que, no caso do cinema de Chris Marker, não deixa de ser militante. O que propomos, então, para esse trabalho, é pensar a forma como Marker abriga olhares múltiplos em seu cinema, revelando um caráter ao mesmo tempo militante e ensaísta em quatro filmes: Le joli mai (1962), Até logo, eu espero (1967), O fundo do ar é vermelho (1977/1988/1993/1998) e Sem sol (1983).

Bibliografia

    COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
    COOPER, Sarah. French film directos: Chris Marker. Machester: Manchester University Press, 2008.
    GRANT, Paul Douglas. Just some of the ways to shoot a strike: Militant filmmaking in France from ARC to the Groupe Medvedkine. In: Situations: Project of the Radical Imagination, vol. 4, nº1, 2011.
    LINDEPERG, Sylvie. Imagens de arquivos: imbricamento de olhares. In: Catálogo Forum.doc, Belo Horizonte, 2010. Entrevista concedida a Jean-Louis Comolli.
    LUPTON, Catherine. Chris Marker: Memories of the Future. Londres: Reaktion Books, 2005.
    RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: Estética e política. São Paulo: EXO experimental org.; Ed 34, 2005.
    RANCIÈRE, Jacques. A estética como política. In: Devires, Belo Horizonte, V. 7, N. 2, p. 14-36, jul-dez 2010.