Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Agda Patrícia Pontes de Aquino (UFPB)

Minicurrículo

    Agda Aquino é professora de figurino e direção de arte do curso de cinema e audiovisual da UFPB. Também é docente das disciplinas de fotografia e televisão do curso de jornalismo da UEPB. Possui mestrado em Estudos da Mídia, onde pesquisou o figurino do jornalista de televisão. Tem especialização em Redação Jornalística e formação em Design de Moda. Coordena o projeto de extensão da Revista Xique Xique, que objetiva fortalecer a identidade e a cultura do povo nordestino através da moda.

Ficha do Trabalho

Título

    O figurino em Os 10 Mandamentos: a moda como estratégia de consumo

Resumo

    Este trabalho analisa como o figurino do filme “Os 10 Mandamentos”, da Rede Record, é usado para aproximar o público da trama, ao o atualizar para as tendências de moda atuais e optar por uma produção com afinco histórico relativizado e verossimilhança questionável. Além de multimidializar o produto em plataformas como televisão, cinema e internet, a emissora também criou coleções de moda inspiradas na trama para comercialização junto ao público, levando-o das telas para a vida das pessoas.

Resumo expandido

    O figurino é um dos principais elementos da narrativa visual de uma obra cinematográfica, capaz de identificar, caracterizar, mostrar passagens de tempo, de situações, de temperamentos, de humor e compor, juntamente com outros itens, a atmosfera do filme. No filme brasileiro “Os 10 Mandamentos”, produzido pela Rede Record de Televisão em 2015, com direção de Alexandre Avancini, há a intenção da caracterização histórica por se tratar uma obra épica, porém, a construção imagética das personagens não é fidedigna às vestimentas usadas no Antigo Egito, época em que a história se passa. Uma rápida pesquisa identifica que roupas, acessórios, maquiagens e mesmo os tipos físicos dos atores são adaptados a uma estética que tem vários pontos em comum com os conceitos de beleza da contemporaneidade. Sabendo que o figurino cinematográfico pode ser realista ou para-realista, os elementos das tendências de moda atuais, como esmaltes, maquiagens, cores de roupas, cortes e acessórios foram inseridos na trama de forma livre e sem comprometimento da narrativa, porém carregados de intencionalidade.
    Ao adaptar as vestimentas aos gostos atuais, os produtores aproximam a narrativa dos espectadores, diminuem a sensação de estranhamento, recorrem a estereótipos, facilitando o entendimento do grande público e criam a possibilidade de consumo de produtos ao inserir no mercado itens de moda inspirados na trama. Assim, há um desdobramento da obra, que migra da(s) tela(s) para os corpos, transmidializando-se.
    O roteiro é baseado na história bíblica de Moisés e do povo hebreu: uma adaptação cinematográfica da telenovela homônima, que alcançou altos números de audiência para o histórico da emissora. O filme é, na verdade, uma nova edição do material que foi produzido para televisão. A série televisiva também migrou para outras plataformas como YouTube e Netflix, objetivando atingir um público ainda maior.
    A emissora, vinculada à Igreja Universal do Reino de Deus, já investiu em outras produções audiovisuais de cunho religioso, porém esta é a primeira vez que transforma uma telenovela em um filme, que esteve em cartaz em cinemas de todo o Brasil e atingiu números significativos de vendas de ingressos, muitos deles comprados pela própria igreja e distribuído para os fiéis.
    Desde Cleópatra, dirigido por Cecil B. DeMille em 1934, parece ter-se criado uma tradição da caricatura egípcia no cinema. Na versão brasileira dos 10 Mandamentos não é diferente. O figurino, apesar de grandioso e diversificado, é muitas vezes baseado no exagero e na falta de verossimilhança: parece não haver preocupação com continuidade e envelhecimento de peças ao decorrer da narrativa, por exemplo. Porém, como grande vitrine de tendências de moda no Brasil, a telenovela e, consequentemente, o filme, repercutiram midiaticamente e fomentaram o desejo pelo uso de peças iguais, similares ou inspiradas na obra.
    A emissora decidiu criar coleções que pudessem ser comercializadas diretamente pela página da Rede Record na internet e deu início a um projeto de produtos licenciados da emissora. Em março de 2016, em parceria com a empresa Vicky Bijoux, a enpresa lançou uma coleção de acessórios inspirados nos distintos núcleos da obra e dividida em quatro tipos: Egípcias, Hebreias, Midianitas e pulseiras de medalhas. Os colares, brincos e anéis não fazem referência apenas às personagens da obra, mas também às tendências de moda em vigor atualmente. No mês seguinte, em parceria com a marca Bella Brazil, foi lançada uma coleção de 12 esmaltes, cada um com o nome de uma personagem feminina da trama.
    Dessa forma, identificamos o figurino usado como estratégia para produção de peças que sejam consumidas pelo público, numa espécie de extensão da obra para a vida das pessoas. Uma forma de se conectar com elas, reverberando o discurso ideológico da emissora, de maneira multimidiática e convergente: televisão/cinema/Internet e, por fim, os corpos do público/consumidor de mídia, de ideias, de produtos.

Bibliografia

    BARTHES, Roland. Sistema da moda. São Paulo: Companhia Editora Nacional, Editora da Universidade de São Paulo, 1979.
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    BETTON, Gérard; MARTIN, Marcel. Estética do cinema. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
    KELLNER, Douglas. A cultura da mídia. Bauru, SP: Editora da Universidade do Sagrado Coração, 2001.
    LEITE, Adriana; GUERRA, Lisette. Figurino: uma experiência na televisão. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
    LIPOVETSKY, Gilles. Império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
    MIRANDA, Ana Paula de. Consumo de moda: a relação pessoa-objeto. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2008.
    MORIN, Edgar. As Estrelas: mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989.
    MUNIZ, Rosane. Vestindo os nus: o figurino em cena. Rio de Janeiro: Senac Rio, 2004.
    STANISLAVSKI, Constantin. A construção da personagem. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.