Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Mariana Sibele Fernandes (UFJF)

Minicurrículo

    Graduada em Filosofia e em Comunicação Social (Jornalismo) pela Universidade Federal de São João del-Rei. Mestranda em Cinema e Audiovisual no Programa de Pós-Graduação em Artes, Cultura e Linguagens da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde pesquisa as tendências do documentário brasileiro contemporâneo.

Ficha do Trabalho

Título

    Tempo e Memória no documentário de tendência slow cinema

Resumo

    O fascínio pela dimensão temporal, evidenciado na forma e ou na temática de algumas obras, marca uma das principais características encontradas em parte do documentário brasileiro contemporâneo. A ênfase na passagem do tempo ganha maior relevo quando, na busca incessante pela experiência singular do outro, os filmes abordam a memória pessoal como possibilidade de relacionar o ordinário a um modo particular de ser e de estar num mundo em devir – tendências estilísticas do chamado slow cinema.

Resumo expandido

    Há, em parte da produção documental brasileira contemporânea, um fascínio pela ideia de passagem do tempo, explícita nas formas dos filmes e ou nas temáticas por eles abordadas. A fugacidade, quando compreendida a partir do mundo mais pessoal do outro, propõe-nos que este lugar, o da alteridade, seja o mais oportuno para se pensar a nossa própria existência humana comum, fundada na condição inexorável do devir. A memória, tantas vezes relacionada ao passado, ao eventual e às coletividades, ganha, nesta analogia intrínseca à temporalidade futura, e com o que há de mais ordinário no universo pessoal, uma nova dimensão. Trata-se de uma ênfase mais filosófica e de uma orientação mais ontológica do que propriamente histórica ou sociológica, o modo como a memória é apresentada em alguns documentários realizados a partir dos anos 2000.
    Faz-se necessário, antes de adentrarmos em alguns dos fundamentos que norteiam essa forma mais recente de se pensar a memória no filme – a partir de sua extensão mais pessoal, associada ao cotidiano e ao devir -, perceber, na própria história do documentário brasileiro, como os modos de representação do mundo do outro foram se alterando. Ao longo dos anos 1960, 1970, 1980, 1990 até a contemporaneidade, outros processos estilísticos foram experimentados. E em igual medida, também, na área acadêmica novas perspectivas acerca da memória e da cultura foram propostas por estudiosos, coincidindo, em alguns aspectos, com as mesmas aspirações e contextos históricos em que os filmes foram produzidos.
    O objetivo desta análise, fundada em estudos outros que não abarcam o repertório cinematográfico, é propor uma investigação, em nível de aprofundamento, a fim de entender o crescente interesse de documentaristas pelos assuntos que incluem a memória pessoal e, consequentemente, a relação intrínseca desta com o devir. Compreender como os cineastas, em oposição ao “tipo sociológico” (BERNARDET, 1985) que era a forma mais comum de apresentação do mundo do personagem na década de 1960, foram se alterando. Como os modos de fazer documentário, na contemporaneidade, têm incluído um universo cada vez mais íntimo do personagem e das questões existenciais que atingem o ser humano, cineasta ou espectador.
    Questões estas que são, muitas, de ordem filosófica, como a angústia existencial apreendida pela própria ideia de passagem do tempo, a vida e a morte – observada no universo íntimo de Bastu, personagem do filme Girimunho (2011), de Helvécio Marins e Clarissa Campolina, principal objeto de estudo deste trabalho; e As vilas volantes: O verbo contra o vento (2005), de Alexandre Veras, cujas paisagens das dunas, em constante transformação, remetem à mesma ideia de dissolução. Ou, simplesmente reflexões sobre o devir temporal e o caminhar existencial, a partir dos mundos mais pessoais dos personagens de documentários como Trecho (2006), também de Marins e Campolina e A alma do osso (2004) e Andarilho (2006), ambos de Cao Guimarães.
    A questão temporal, nestes documentários, ocupa papel de centralidade. Pouco interessados em uma narrativa linear (tradicional), alguns dos filmes contemporâneos propõem mais uma representação conceitual, fragmentada e poética, cujas imagens devem ser mais contempladas do que compreendidas num sentido de desencadeamento da história. Assim como o tema, a forma destes filmes também se atêm à dimensão temporal. No atual cenário de discussões cinematográficas internacionais, fala-se em uma chamada tendência slow cinema, onde as características estilísticas predominantes, muito se assemelham a algumas das produções nacionais, tais como a falta de enredo, o foco no cotidiano e o uso excessivo de tomadas longas.
    Pretende-se aqui, traçar um paralelo, tanto quanto possível, entre os documentários brasileiros contemporâneos, interessados em memórias pessoais, cuja ênfase na dimensão temporal, característica mais evidente, coloca-os, em alguma medida, próximos às discussões acerca do slow cinema.

Bibliografia

    COMOLLI, Jean-Louis. Os homens ordinários, a ficção documentária. In: SEDLMAYER, Sabrina; GUIMARÃES, César; OTTE, Georg (orgs.). O comum e a experiência da linguagem. Belo Horizonte: UFMG, 2007.
    FLANAGAN, Matthew. Towards an Aesthetic of Slow in Contemporay Cinema. 16:9 Danmarks Klogeste, v.6, n.29, 2008. Disponível em: . Acesso em: 15 out. 2015.
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    HUYSSEN, Andreas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2000.
    NAGIB, Lúcia. Tempo, magnitude e mito do cinema moderno. In: DENNISON, Stephanie (org.). World Cinema. As novas cartografias do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2013.
    RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Trad. Alain François et al. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007.