Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Fernanda Resende Serradourada (Unicamp)

Minicurrículo

    Mestranda em Multimeios na Unicamp

Ficha do Trabalho

Título

    CORPOS E SUBJETIVIDADES ANIMADAS: A ESTÉTICA DE MONIQUE RENAULT

Resumo

    Experimentações quanto à linguagem e representações de corpos eram o mote de Monique Renault e outras animadoras do cinema de animação independente dos anos 70. Filha do Maio de 68 e desejosa de uma estética guiada pelas questões de gêneros, ela resistia ao “Betty Boopismo” e às representações de mulheres com enormes curvas e cílios. O corpo representado era chave nesse processo. Mas no que as singularidades da representação animada contribuíam para a construção desses corpos?

Resumo expandido

    A animação tem a capacidade singular de apresentar questões sociais complexas, tabus e sentimentos em formas subjetivas bem diferentes das que o live-action consegue proporcionar. Singularidades essas que podem dar bastante voz à subjetividade e à expressão pessoal do artista, podendo ser um caminho intenso para entender nosso mundo social sob outra perspectiva, mostrando coisas de uma forma que o “mundo real” não mostra. Representar imageticamente algo que não pode ser visto, representar o invisível e o espaço interno, conceitos abstratos e estados inimagináveis onde a subjetividade se faz muito presente.
    Com a consciência deste poder e impulsionada pelo movimento feminista e pelo movimento dos direitos civis na década de 1970, a animadora feminista franco-holandesa Monique Renault fazia animações em que experimentava e propunha novas formas e corporalidades animadas que transformavam as noções tradicionais de gêneros. Filha do Maio de 68 fugia da representação de corpos com enormes curvas e cílios e ironizava a virilidade da forma animada masculina. Novas corporalidades animadas essas que eram construídas através da ambigüidade, mutabilidade e que representavam as formas femininas como sujeitos e não como objetos narrativos marginais ou espetáculos eróticos, que ao mesmo tempo revelavam a relação de mulheres com seu próprios corpos, as percepções de seus espaços privados e públicos, suas identidades sociais e políticas dentro do espaço doméstico e profissional e relações entre sexualidade, desejo e criatividade. As corporalidades podiam variar desde uma simples linha animada solta no espaço, ambígua e altamente mutável (e que se transforma em diversas outras formas) até em corpos representados com formas mais semelhantes ao nosso “mundo real”.
    A fluidez e performatividade da linha, a criação de um design original, o engajamento com narrativas diferentes que desafiavam narrativas lineares da animação mais tradicional e a adoção de pautas altamente pessoais e sobre questões de gêneros, resultaram na politização direta de Monique Renault e outras animadoras no cinema de animação. A resistência ao “boopismo” (em referência a personagem Betty Boop), como ficou conhecido, era muito mais que apenas uma rejeição ao design altamente sexual do corpo feminino. Era uma resposta direta para as representações feitas através de códigos e formas ortodoxas e tradicionais, associadas aos códigos Disney e masculinos de composição e construção narrativa, pessoal, social e política. Também era o reconhecimento das possibilidades e tecnologias disponíveis para as mulheres na criação de novos corpos, códigos, gêneros e subjetividades uma vez que esses códigos tradicionais estavam sendo derrubados.
    É nesse sentido que a animação como linguagem era vista potencialmente como um vocabulário radical e uma tecnologia formadora de gêneros. Radicalidade, experimentalismo e irreverência eram palavras chaves ao movimento. Uma busca por novas linguagens e estéticas que se utilizavam das particularidades da técnica da animação, como a mutabilidade, a fluidez da forma e o poder de tornar visível o invisível, e que dificilmente são conquistadas através da imagem live-action. A representação do corpo passava então de mero objeto a sujeito, se afastando de representações eróticas e/ou papéis secundários, criando uma nova linguagem, novas formas e subjetividades fluídas e performáticas, criticando as tradições e preenchendo o buraco entre a representação e o referente. A representação não era meramente um processo de transmitir conhecimento ou experiência, mas era em si mesma o coração do dilema.
    É a partir deste parâmetro que pretendemos analisar Swiss Graffitti (1975), curta-metragem de animação de Monique Renault através do relacionamento dos campos teóricos do feminismo, do queer e do cinema de animação por Laura Mulvey, Teresa de Lauretis, Judith Butler, Paul Wells e Jayne Pilling.

Bibliografia

    BUTLER, J. Bodies that Matter: On the Discursive Limits of “Sex”. Nova York e Londres: Routledge, 1993
    LAURETIS, T. Technologies of Gender: Essays on Theory, Film and Fiction. Bloomington: Indiana University Press, 1989.
    MULVEY, L. Visual Pleasure and Narrative Cinema. Londres: Routledge, 1992.
    PILLING, J. Animating the Unconscious: Desire, Sexuality and Animation. Nova York: Columbia University Press, 2012.
    PILLING, J. A Reader in Animation Studies. Sydney: John Libbey & Company Pty Ltd: 1997.
    WELLS, P. Understanding Animation. Londres: Routledge, 1998.