Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Henrique Codato (UFC)

Minicurrículo

    Possui graduação em Comunicação Social – habilitação em Relações Públicas – pela Universidade Estadual de Londrina (UEL, 2001); mestrado em Comunicação pela Universidade de Brasília (UnB, 2004), e em Literatura Comparada pela Universidade de Genebra (Unige – Suíça, 2007); doutorado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, 2013). Atualmente, desenvolve pesquisa de pós-doutoramento no Instituto de Comunicação e Artes (ICA) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Ficha do Trabalho

Título

    Corpo, desejo e perversão no cinema de Larry Clark.

Resumo

    Por meio de um diálogo com diversos autores do campo do cinema, dos estudos da imagem e da psicanálise, e a partir da ideia de perversão tal qual defendida por Deleuze (2009, p.28), como uma “intrínseca transformação de energia” que tem o mérito de “trazer o corpo para o campo do pensamento”, propomos analisar três sequências de três filmes de Larry Clark – “Kids” (1995); “Ken Park” (2002) e “O Cheiro da Gente” (2015), buscando demonstrar como essa perversidade do olhar, traço estilístico do cinema de Clark, se constitui na relação estabelecida entre o olho mecânico de sua câmera e o corpo adolescente, obsessão do cineasta.

Resumo expandido

    Filmar a adolescência e o corpo adolescente tem sido o gesto primordial de diversos diretores do cinema contemporâneo: Gus Van Sant, Sofia Coppola, Bernardo Bertolucci, Richard Linklater, Xavier Dolain; os brasileiros Domingos de Oliveira e Lais Bodanzky; enfim, a lista é extensa. Nesse sentido, propomos levantar e problematizar algumas questões acerca da imagem da adolescência a partir de uma visita a três filmes do fotógrafo e cineasta estadunidense Larry Clark. Suas obras que aqui nos interessam – “Kids” (1995); “Ken Park” (2002) e “O Cheiro da Gente” (2015) – são, sem dúvida, os mais conhecidos trabalhos de Clark no cinema, e compõem (ou, pelo menos, assim entende boa parte da crítica especializada) uma espécie de retrato cinematográfico geracional da juventude nas três últimas décadas, do mesmo modo que o conjunto de seus trabalhos fotográficos – com destaque aos emblemáticos Tulsa (1971) e Teenage Lust (1983) – também sirva, de algum modo, para testemunhar sobre os hábitos de uma época, de um determinado grupo de adolescentes.
    É possível defender que seus filmes se referem a uma comunidade bastante específica – os chamados skaters, integrantes de uma subcultura que nasce nos EUA, no início da década de 1990, em torno da prática do skate e do uso de drogas – principalmente da maconha – e que se propaga mundo afora por meio, principalmente, da música (Nirvana, Bad Religion, Green Day e NOFX) e da moda (camisetas e calças largas, roupas íntimas à vista, boné para trás), com uma estética que vai, posteriormente, dialogar com os movimentos hip hop e rap. No entanto, apesar das especificidades dessa dita comunidade, há um eixo comum que atravessa essas narrativas e é dele que partem nossas reflexões. Todas elas falam da adolescência – “tempo extraordinário em que as pessoas desconhecem que estão verdadeiramente a viver”, como definiu belamente o cineasta Manoel de Oliveira (2007) – período da vida marcado por profundas transformações, tanto exteriores (do e no corpo), quanto interiores (da vida sentimental, emocional, subjetiva).
    Interessa-nos refletir como Clark se serve do signo da adolescência e da figura do adolescente em seus trabalhos. Não se trata exatamente de analisar sua representação no âmbito da diegese, mas, sim, de tentar compreender a economia sensível que suas obras colocam em cena quando se propõem a retratar a adolescência; analisar aos modos de endereçamento do olhar que sua câmera constrói ao filmar o corpo vivo e em transformação desses adolescentes. Nossa hipótese é a de que o cinema de Clark opera a partir de uma mecânica perversa; entendendo a perversão, aqui, menos como uma estrutura de personalidade (como reza a psicanálise) e mais como uma estratégia retórica, naquilo que sua etimologia mesmo indica (per: totalmente, e vertere: virar). Em termos deleuzianos, trata-se de uma “intrínseca transformação de energia” que tem o mérito de “trazer o corpo para o campo do pensamento” (DELEUZE, 2009, p.28). Dito de outro modo, defendemos que a perversão, para além de um desvio normativo, se torna, nas narrativas clarkeanas, uma manobra estilística, algo que se pode capturar na própria forma fílmica; que se revela (ou que se esconde) nos modos de endereçamento/enquadramento do olhar lançado sobre esses adolescentes, na maneira de inscrever a matéria elástica e inacabada de seus corpos no espaço do filme.
    Assim, por meio de um diálogo com autores do campo do cinema, dos estudos da imagem e da psicanálise, e a partir da análise de uma sequência de cada um dos filmes escolhidos, buscaremos mostrar como essa perversidade do olhar, traço estilístico do cinema de Clark, se constitui na relação estabelecida entre câmera e corpo filmado. A poética destas obras está absolutamente vinculada ao corpo, ao sexo e à morte – ao erotismo, portanto – e subsiste na exploração da imagem desses adolescentes e de seu universo, que o diretor, de forma bastante particular, explora a fim de perverter o olhar e o desejo de tudo ver.

Bibliografia

    BATAILLE, G. O Erotismo. Porto Alegre: LP&M, 1997.
    DELEUZE, G. Sacher-Moasoch: o Frio e o Cruel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
    _____. A Imagem-Movimento. São Paulo: Brasiliense, 2010.
    LACAN, J. O Seminário 4: a relação do objeto – A função do véu. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.
    MONDZAIN, M-J.(org). Voir Ensemble: autour de Jean-Toussaint Desanti. Paris: Galimard, 2003.
    _____. Homo Spectator. Paris: Bayard, 2007.
    MORIN, E. Le cinéma ou l’homme imaginaire. Paris: Les éditions de minuit, 1956.
    MULVEY, L. “Prazer Visual e Cinema Narrativo”. In XAVIER, Ismail. (org.) A Experiência do Cinema. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983.
    OLIVEIRA, M. Entrevista. Fenprof, 2007. Disponível em: [URL]: http://www.fenprof.pt/?aba=57&cat=185&doc=3002&mid=123. Consultado em 14 de maio de 2016.
    VERNET, M. Figure de l’absence de l’invisible au cinéma. Essais. Paris: Cahiers du Cinéma, 1988.
    XAVIER, I. O Discurso Cinematográfico: A Opacidade e a Transparência. São Paulo: Paz e Terra, 2008.