Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Bárbara Xavier França (UFMG)

Minicurrículo

    Doutoranda em Literatura Comparada pelo Programa de Pós-graduação em Estudos Literários (Poslit) da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais. Possui graduação em Comunicação Social/Jornalismo pela UFMG (2011) e mestrado pela linha de Pragmáticas da Imagem do Programa de Pós-graduação em Comunicação (PPGCOM) da mesma universidade (2014). Interessa-se, principalmente, por cultura e política na América Latina, alegoria, memória, luto, violência e pós-ditadura.

Ficha do Trabalho

Título

    Sujeitos à margem e exílio no cinema latino-americano contemporâneo

Seminário

    Cinema e América Latina: debates estético-historiográficos e culturais

Resumo

    A partir de filmes dos diretores Lisandro Alonso e Pablo Trapero, associados ao chamado “minimalismo expressivo” do cinema argentino do século XXI, o trabalho propõe discutir possibilidades de se abordar novas expressões do exílio no cinema latino-americano contemporâneo. Percebendo a recorrência de temas e estratégias envolvendo ausência, marginalização e migração na produção audiovisual do presente, toma-se o exílio como chave para pensar cultura, política e violência na América Latina.

Resumo expandido

    Um dia na vida de um lenhador. Em La Libertad (Lisandro Alonso, 2001), Misael realiza tarefas típicas do cotidiano de um trabalhador dos rincões dos Pampas, tais como cortar árvores, matar um animal para se alimentar, preparar o almoço, ouvir o noticiário no rádio e vender a madeira obtida. Do mesmo diretor argentino, em Los Muertos (Lisandro Alonso, 2004), Vargas, recém-saído da prisão, atravessa a inóspita região das ilhas, na província de Corrientes, em busca de algum parente sobrevivente. Ele matara todos os seus irmãos, e seu processo de retorno ao lar da filha é marcado pelo puro fazer: andar, caçar, comprar, transar, remar.

    Explorando o universo do trabalho, Mundo Grua (Pablo Trapero, 1999), apresenta um mundo de engrenagens de uma empresa qualquer. Nela, trabalha Rulo, que interage nesse ambiente vertical e, pode-se dizer, suspenso. Demitido por excesso de peso, o personagem consegue um novo emprego e viaja para um lugar desconhecido. Também realizado por Trapero, El Bonaerense (2002) traz Zappa, serralheiro de uma pequena cidade que, porque acusado de roubo após abrir um cofre sob o comando de seu patrão, é levado para Buenos Aires com o objetivo de escapar da prisão. Lá, ele passa a fazer parte de uma instituição policial considerava a mais corrupta da capital argentina.

    Associados ao que tem sido chamado de “minimalismo expressivo” do cinema argentino do século XXI (Prysthon, 2015), os filmes de Lisandro Alonso e Pablo Trapero compartilham do interesse por planos que duram, pelo silêncio das cenas, pela quase ausência de som extradiegético, pelo argumento aparentemente simples ou pouco delimitado e por personagens “menores” – longe dos grandes líderes − que, na maioria das vezes, são representados por atores não profissionais.

    No caso de La Libertad, Los Muertos, Mundo Grua e El Bonaerense, especialmente, a aproximação se dá ainda pela escolha por protagonistas solitários, que, em sua errância no mundo – seja procurando emprego, sendo obrigado a se mudar, procurando um lar de outrora, procurando clientes para seus produtos – estão sempre à margem: do Estado, da economia, do Direito. Suscitadas pelo contato com as obras, ausência, isolamento, procura por uma origem e impossibilidade de retorno são eixos que sugerem, mesmo que de maneiras distintas, a presença de uma mise-en-scène da condição do deslocado ou, ainda, do exilado.

    Com o interesse voltado para as escolhas (formais, estilísticas, narrativas) que se dão no interior do plano, acredita-se que a relação fundamental estabelecida entre espaço e sujeitos nesses filmes, dando a ver uma expressão do inóspito, do entre-lugar e do não pertencimento, conduza ao conceito de exílio. Tomado em seus múltiplos sentidos, sejam políticos, históricos, existenciais, sociais ou econômicos, o exílio é um tema recorrente na produção cultural latino-americana e também considerado aspecto constituinte dos discursos acerca do que significa ser latino-americano (Gomez, 2013).

    Procurando elaborar a experiência dos regimes totalitários e das violências de estado sofridas, o cinema produzido entre as décadas de 1980 e 1990 na região trouxe a temática do exílio com a exploração de emblemas e da nostalgia de uma ideia totalizante da nação. Com uma perspectiva comparativa, o trabalho coteja o chamado de “cinema de transição” às obras de Trapero e Alonso, percebendo estratégias que apontam para “novas representações do exílio” (Gillone, 2015), marcadas pela estraneidade dentro das próprias fronteiras nacionais. A partir dos filmes dos diretores argentinos e de sua lida com condições comuns a grande parte dos países da América Latina, tais como a modernização conservadora, a instabilidade com relação aos governos e economias − que tem produzido cada vez mais alijados de sua terra −, a permanência de situações de exceção e uma irresolvível orfandade, percebemos o exílio como linha de força para pensar cultura, política, violência e pós-ditadura na contemporaneidade.

Bibliografia

    ANDERMANN, J. La imagen limítrofe: naturaleza, economía y política en dos filmes de Lisandro Alonso. Estudios 15: 30. Pp. 279-304, julio/diciembre. 2007.
    CANCLINI, N. G. O Mundo Inteiro como Lugar Estranho. SP: Editora USP, 2016.
    GILLONE, A. D. S. Ressignificações do exílio no cinema argentino. In: Imagem e exílio: cinema e arte na América Latina. SP: Discurso Editora, 2015.
    GÓMEZ, A. Escribir el espacio ausente. Exilio y cultura nacional en Díaz, Wajsman y Bolaño. Santiago: Cuarto Propio, 2013.
    MOLFETTA, A. Naturaleza y personaje en el cine Latinoamericano del nuevo siglo. Toluca de Lerdo, Gobierno del Estado de México, 2011.
    PRYSTHON, A. Paisagens sonhadas: imaginação geográfica e deriva melancólica em Jauja. Devires, BH, v. 11, n. 2, 2014.
    SAID. Reflexões sobre o exílio e outros ensaios. SP: Companhia das Letras, 2003.
    XAVIER, I. O exílio como experiência e como paradigma da condição latino-americana. In: Imagem e Exílio: cinema e arte na América Latina. SP: Discurso Editora, 2015