Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Amanda Brum de Moraes Ponce Devulsky (UERJ)

Minicurrículo

    Graduada em Audiovisual pela Universidade de Brasília com passagem pela Victorian College of the Arts e atualmente mestranda em Processos Artísticos Contemporâneos no PPGArtes/UERJ. Dirigiu curta-metragens e trabalhou na produção de mostras e festivais. Em 2015, co-fundou o Verberenas, espaço virtual colaborativo para escrita e discussão sobre cinema feita por mulheres realizadoras. Interessa-se por tecnologias e estéticas, arte contemporânea e cinema brasileiro.

Ficha do Trabalho

Título

    Pontos cegos no olhar sobre o olhar: Mate-me por favor

Seminário

    O comum e o cinema

Resumo

    Reflexão sobre a recepção crítica ao filme Mate-me por favor (Anita Rocha da Silveira, 2015) enquanto possível sintoma de zonas opacas que formam obstáculo para uma partilha da experiência que não se completa pois não se vê o outro. Com base nesse caso, propomos que tal invisibilidade não decorre de questões de tema ou identidade especificamente, mas do imbricamento entre estética e política que instaura vieses, os quais buscamos mapear.

Resumo expandido

    As relações entre estética e política como colocadas por Rancière (2009) vêem atos estéticos como participação na experiência e construção de mundo, no qual “as artes nunca emprestam às manobras de dominação ou de emancipação mais do que lhes podem emprestar, ou seja, muito simplesmente, o que têm em comum com elas: posições e movimentos dos corpos, funções da palavra, repartições do visível e do invisível” (RANCIÈRE, 2009, p. 26). Tais relações podem encontrar o conceito de wordlessness, de Hannah Arendt, como é utilizado por Raymond (1986) na compreensão das sensibilidades dissociativas do feminino em um contexto no qual não há parte dele no que é comum, nas formas como o mundo – espaço entre – e suas estruturas são construídas e compartilhadas. Nesse encontro, abrem-se possibilidades para pensar tanto caminhos estéticos específicos quanto a desvalorização dos mesmos com base no que são consideradas estéticas mais válidas ou legítimas.

    Desenhando a partir dessa ideia principal para o caso do filme Mate-me por favor (Anita Rocha da Silveira, 2015) e sua resposta crítica no Brasil e no exterior, encontramos vieses muito mais que temáticos ou identitários e podemos relacionar as leituras e olhares sobre a obra com a história dos olhares estéticos quando voltados ao(s) feminino(s) e a experiências de alteridades. A partir de Rosalind Galt (2011), Naomi Schor (2007) e Sianne Ngai (2005, 2010), buscamos mapear zonas opacas no olhar direcionado a experiências do feminino e ficções do feminino para, dessa forma, delinear problemas na epistemologia masculinista que possam minar a relação com manifestações estético-políticas em obras de mulheres/sobre mulheres/com mulheres.

    Os olhares frequentes sobre Mate-me por favor (Anita Rocha da Silveira, 2015) que o consideram exercício estilístico vazio de políticas e de significado são vistos aqui como amostra manifesta de tais vieses intimamente relacionados às análises de Rosalind Galt (2011) sobre a imagem que é “imagística demais” para ser boa, às categorias estéticas femininas de Schor (2007) e aos estudos de categorias estéticas menores de Sianne Ngai (2005, 2010). Nesses trabalhos, encontramos pistas para compreender o fenômeno de críticas negativas correlativas sobre o filme Mate-me por favor e que podem permitir vislumbrar zonas invisíveis que se aplicam em menor ou maior escala em outras experiências do cinema contemporâneo.

    A metodologia proposta aqui de mapeamento dos pontos cegos visa avançar no exercício de estabelecer espaços de ver e discutir cinema que sejam verdadeiramente atentos às relações estético-políticas ali presentes e, dessa forma, mais próximos de uma compreensão de diferença/distância/fronteira que possibilite uma real partilha do comum, enxergando que a diferença é uma característica relacional e que “a compreensão da diferença é uma responsabilidade compartilhada que requer um mínimo de disposição para alcançar o desconhecido” (MINH-HA, 1989, p. 95).

    Esse estudo expande investigações acadêmicas sobre ideias inicialmente expostas na breve resenha O vazio e a penetração, por mim publicada sob o pseudônimo de Karine no site colaborativo Verberenas.

Bibliografia

    GALT, Rosalind. Pretty: Film and the decorative image. New York: Columbia University Press. 2011.

    MINH-HA, Trinh T. Woman, Native, Other: Writing Postcoloniality and Feminism. Bloomington: Indiana University Press. 1989.

    NGAI, Sianne. Our aesthetic categories. Modern Language Association. PMLA, v. 125, n.4, Outubro 2010.

    ______. The cuteness of the Avant-Garde. Critical Inquiry, n. 31, University of Chicago, verão 2005.

    RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: Exo experimental org. 2009.

    RAYMOND, Janice G. A Passion for Friends: Towards a Philosophy of Female Affection. Boston: Beacon Press. 1986.

    SCHOR, Naomi. Reading in detail: Aesthetics and the Feminine. New York: Routledge. 2007.