Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Pedro de Andrade Lima Faissol (ECA/USP)

Minicurrículo

    Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), com pesquisa em andamento sobre a representação do milagre no cinema. Mestre em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA/USP com pesquisa sobre o cinema de Eugène Green. Bacharel em Comunicação Social (habilitação Cinema) pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

Ficha do Trabalho

Título

    A poética cinematográfica de Eugène Green

Seminário

    Teoria dos Cineastas

Resumo

    Em “Poétique du cinématographe”, o cineasta Eugène Green expõe um conjunto de ideias que caracterizaria a gênese e a natureza do cinema. O cinematógrafo, segundo sua cosmovisão, teria como vocação dar visibilidade ao Verbo, reconciliando o presente da obra de arte (reformada pelo espírito no ato da criação) com o elo divino perdido no passado. A comunicação consiste em confrontar seus postulados estéticos com as operações descritas para resolver problemas concretos ligados à práxis do cinema.

Resumo expandido

    “Poétique du cinématographe” é um livro publicado em 2009 pelo cineasta radicado na França Eugène Green. O conjunto de ensaios que compõe o livro é redigido inteiramente em parágrafos curtos, muito sintéticos, beirando o aforismo. Green resgata uma tradição literária um pouco perdida no tempo: a tradição das poéticas. Como disciplina teórica, a poética é o estudo das obras que define suas características gerais, criando conceitos que podem ser generalizados para a compreensão de outras obras do gênero. Assim, retomando o tom assertivo das poéticas do passado, e se juntando – no gesto e na erudição – aos cineastas Robert Bresson (“Notas sobre o cinematógrafo”) e Raúl Ruiz (“Poétique du cinéma”), Eugène Green dá vazão a um conjunto de ideias objetivas que caracterizaria a gênese e a natureza do cinema – chamado aqui, tal como fizera Robert Bresson no passado, de “cinematógrafo”.

    O livro de Green é dividido em duas partes. Na parte 1, intitulada “A Ideia”, Green inicia uma digressão que remonta ao Antigo Testamento, refratando a oposição iconoclasta entre a palavra e a imagem. Segundo Green, essa dicotomia – manifestação do puritanismo vigente – ignora a tradição das Escrituras, já que a aparição de Deus para Moisés se dá tanto pela visão quanto pela escuta. A sua reflexão teórica está filiada a uma tradição da ortodoxia cristã que não distingue a imagem da palavra falada. Segundo o Evangelho de João, Jesus Cristo é a encarnação do verbo divino, e a matéria desse verbo é feita de luz. Há, portanto, uma sugestão de equivalência entre a Luz e o poder criador do Verbo.

    Ao longo do texto, enquanto desenvolve o conjunto de crenças que compõe sua cosmovisão, Eugène Green atravessa a história da filosofia cristã trazendo para seu lado nomes como São Paulo, Mestre Eckhart, Giordano Bruno, Blaise Pascal, Padre Antônio Vieira etc. O apogeu e o declínio dessa tradição mística teria se dado durante o período barroco, época em que o homem era ainda dominado pelo desejo contraditório de revelar o “Deus Escondido”, ao mesmo tempo em que gradualmente criava um modelo do universo que O excluía.

    O postulado estético de Green consiste em dar visibilidade ao Verbo, reconciliando o presente da obra de arte (reformada pelo espírito no ato da criação) com o elo divino perdido no passado. O cinematógrafo, ou seja, o cinema ideal segundo a sua particularíssima concepção artística, seria “o verbo feito imagem” (GREEN, 2009, p. 15). Em franca oposição às outras artes (e, em larga medida, em oposição ao próprio cinema), o cinematógrafo teria o compromisso de – naquilo que o aproximaria de André Bazin – manter a integridade do mundo filmado; razão pela qual Green advoga pela proscrição de qualquer deformação que perturbe a apreensão estritamente material do quadro cinematográfico. Essa fidelidade ao mundo concreto, paradoxalmente, faria revelar uma “presença real” invisível. O cinematógrafo, a vocação metafísica do aparato, consistiria em dar visibilidade a um mundo espiritual sem o qual [o aparato em si] seria impossível acessar diretamente.

    Na parte 2 do livro (intitulada “A Prática”), Eugène Green expõe as soluções encontradas – enquanto realizador – para resolver problemas concretos ligados ao roteiro, à fotografia, ao som e ao trabalho com o ator. Ao longo da comunicação, objetiva-se avaliar em que medida as operações descritas na parte 2 de sua poética (operações ligadas à práxis do cinema) conseguem corresponder às ideias enunciadas na parte 1.

Bibliografia

    BAZIN, André. “O Que é o Cinema?” São Paulo: Cosac & Naify, 2014.

    BRESSON, Robert. “Notas sobre o cinematógrafo”. São Paulo: Iluminuras, 2005.

    GREEN, Eugène. “Présences”. Paris: Desclée de Brouwer, 2003.

    _________. “Poétique du cinématographe”. Arles: Actes Sud, 2009.

    RUIZ, Raoul. “Poétique du cinéma”. Paris: Éditions Dis voir, 1995.